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quinta-feira, 16 de maio de 2024

Bernardo Zurzica Dias, A fundamentação jurídica nos regulamentos administrativos

 

Trabalho realizado por: Bernardo Zurzica Dias, subturma 15, nº aluno: 67949

 

 

A fundamentação jurídica no regulamento administrativo

 

  A fundamentação das atuações jurídicas administrativa é uma temática bastante importante, que reside no Direito Administrativo.

 

   Primeiramente, há que salientar que em linguagem comum, o conceito "fundamentação" pode ser entendido não só como uma exposição enunciadora das razões ou motivos da decisão, em que se privilegia o parâmetro formal da operação, estando ligado à transparência da decisão, mas também como à recondução do decidido a um parâmetro valorativo que o justifique, integrando-o num sistema de referência, em que encontre bases de legitimidade[1].

 

    Existem dois âmbitos sobre esta matéria em questão, relativo à fundamentação. A composição dos fundamentos num enunciado linguístico reflete o aspeto "público" da decisão, tornando-a acessível à compreensão da comunidade dos destinatários, permitindo, naturalmente, o seu acesso, ou seja, o seu conhecimento crítico, que se baseia numa dimensão intersubjetiva. Noutra perspetiva, a justificação normativa é exigida pelo caráter jurídico e vinculado do ato, intencionalmente, dirigido à percussão de fins estabelecidos numa ordem jurídica, ou seja, de Direito.

Conclui-se que não será adequado, confundir a fundamentação com a justificabilidade objetiva, ou com a conformidade ao Direito, que se traduz na juridicidade da decisão, reduzindo-a a uma qualidade, mas também não se poderá conformar como fundamentação, uma pura indicação de motivos "publicitários", que não constitua ou não pretenda ser um "discurso" justificativo. [2]

 

    A doutrina reflete, principalmente, quando está em causa não só a prática de um ato administrativo, mas também no âmbito dos regulamentos, sendo possível identificar uma fundamentação forma. Baseia-se numa simples exposição dos motivos da decisão, e que é complementada por uma fundamentação material, que se define por uma projeção da decisão no panorama dos seus parâmetros de validade, e possui como última finalidade a correção material das normas regulamentares.

 

    No plano normativo, a fundamentação apresenta uma função de autocontrolo, proteção jurídica individual, que tem como visados os destinatários. E, por fim, uma fiscalização judicial, que de certa forma, permite que o órgão decisor, na execução de um juízo de prognose póstuma, controle quer a oportunidade, quer a conveniência das medidas normativas.

Tendo em vista, o relatório elaborado pelo órgão instrutor, e que os respetivos destinatários afirmam da respetiva legalidade, a fundamentação assume um papel preponderante, para uma fiscalização judicial da legalidade do regulamento.

 

   Aquando da conclusão, do projeto de regulamento, dever-se-á ser realizada uma nota justificativa fundamentada, de acordo com o disposto no artigo 99 CPA.A fundamentação deverá incluir no mínimo não só a demonstração da necessidade, ou conveniência da adoção do regulamento, mas também do seu conteúdo.[3] A nota justificativa traduz-se num documento interno da administração, que tem como propósito dar ao órgão com competência regulamentar os elementos preponderantes, para a sua decisão na perspetiva funcional, apresentando bastantes semelhanças relativamente, ao relatório do instrutor no procedimento, para a emissão de atos administrativos, do que a fundamentação destes[4].

 

Naturalmente, que se compreende a preocupação manifestada pelo legislador do CPA, que sob a epígrafe «projeto de regulamento», estabelece a obrigatoriedade de projeto de regulamento, que é acompanhada de uma "nota justificativa fundamentada", como dispõe o artigo 99 CPA.  

 

    A nota justificativa abarcará, por conseguinte, a fundamentação administrativa que compreende a referência aos vários interesses públicos envolvidos, o que se traduz, naturalmente, na formulação de uma profunda avaliação de ponderação entre custos e benefícios. E a fundamentação jurídica das medidas que estão presentes no diploma, o que implica, necessariamente, a respetiva referência das normas legais que servem de sustento à emissão do regulamento.

 

   A fundamentação administrativa, além da importância que possuiu ao nível da interpretação, assume um caráter vital, relativamente ao controlo do mérito e da oportunidade das normas emanadas pelo órgão. Permite, minimamente, o controlo da habilitação, e com a exteriorização do imperativo dirigido às entidades administrativas de debruçarem um olhar rigoroso às questões factuais e jurídicas da respetiva atuação, in casu, no âmbito de um procedimento regulamentar.

 

   Há que frisar que a fundamentação pressuposta pelo artigo 99 CPA corresponde a uma obrigação puramente endoprocedimental. Contudo, os artigos 100 e 101 CPA visam apenas à audição, ou à apreciação pública do projeto de regulamento, respetivamente, deve entender-se que tal referência não envolve apenas o articulado do diploma, ou seja, aquilo que é entendido como o projeto em sentido estrito. Acrescentando também a respetiva nota justificativa, podendo o órgão optar por realizar notas justificativas diferentes, mas coerentes entre si, em função dos destinatários em causa e dos planos em que decorrem, que se reporta, não ao texto dado como final do regulamento, mas, unicamente, ao respetivo projeto de articulado.

 

    Em outros sistemas jurídicos, e no próprio direito europeu a solução adotada é diversa, em relação ao procedimento de elaboração de normas regulamentares. Particularmente, no direito da União Europeia, o artigo 296 TFUE impõe a fundamentação dos atos jurídicos, e encontra correspondência com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, que tais atos contenham uma demonstração das razões de facto, e de direito que conduziram à sua emissão. De maneira que, o Tribunal tenha a possibilidade de controlá-los, e que os Estados-Membros ou outros interessados tenham acesso ao respetivo conhecimento às condições, nas quais as instituições comunitárias aplicaram o Tratado.

 

   Seguindo os termos do nº7 do artigo 112 CRP, dá a perceção que apenas a fundamentação jurídica presente na citação da lei habilitante, terá de estar presente no texto final do regulamento. Dado que essa referência, para além de transmitir transparência ao diploma regulamentar, e demonstrar o seu perfil de diploma normativo com valor infralegal, protagoniza de uma maneira mais acessível a sindicabilidade contenciosa[5] do regulamento, e realiza o princípio da precedência de lei.

 

   Porém, os órgãos não estão impedidos de, no próprio texto do diploma regulamentar, referirem os respetivos fundamentos, e por complemento de procederem ao cumprimento do dever de citação da lei habilitante. Desde logo, tal explicitação poder-se-á demonstrar favorável para defesa da própria Administração, contribuindo, inclusivamente, para um mais adequado controlo judicial da juridicidade das normas, no que tange ao cumprimento dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, nem sempre reconhecidos pela simples análise do articulado normativo.

Há que tentar demonstrar, se não se poderá alcançar mais, ao advogar a necessidade de fundamentação, no texto final, dos regulamentos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos. Efetivamente, já existe uma primeira fundamentação, que está presente no projeto de regulamento, não se revela menos discipiendo que a transparência, a racionalidade do agir administrativo e o efetivo conhecimento pelos cidadãos dos motivos determinantes das opções quer políticas, quer jurídicas, que constam do regulamento sairiam reforçados.

 

   O facto de o texto final do regulamento não ter de abarcar, obrigatoriamente, toda a fundamentação que consta da nota justificativa, não impede a situação, de que a falta da elaboração dessa respetiva nota, que acompanha o projeto se traduza na invalidade do diploma final, por vício de procedimento.

A doutrina frisa que se trata de uma formalidade basilar, para o adequado desenvolvimento da fase de participação dos cidadãos, na circunstância de a inexistência de fundamentação repercutir-se na inviabilidade de uma esclarecida intervenção dos particulares no procedimento regulamentar. E, principalmente, quando tal participação se traduz no exercício de um direito fundamental, visando ainda o interesse público na clarificação do exercício do poder regulamentar[6].

  

   A tradição que garante a fundamentação, que possuiu algumas interligações de envolvimento doutrinário com as conceções substancialistas, mais sustentadas do ponto de vista histórico, tem realizado uma perspetiva do imperativo da fundamentação, apenas como um auxílio ao recurso contencioso, desconectando os traços essenciais do seu regime, que está relacionado com a admissibilidade da sanção. Passando pelas medidas de suficiência, exemplificativamente, a partir da visão unitária da função de proteção jurídica. A ligação entre a fundamentação e a reação contenciosa tem enquadrado todos os diversos contornos do imperativo formal, que em certa parte não deixa de ter fundamento real[7].

 

  Naturalmente que, é incontestável que assiste à imposição da fundamentação expressa uma componente de proteção jurídica, cujo propósito essencial incide sob a identificação do interior da decisão como forma de auxílio instrumental, perante a reação impugnatória. Por via da fundamentação, é possível identificar os diversos dados que condicionam a decisão, o que permite moldar uma defesa nacional mais organizada, segundo os elementos interiores relativos à decisão, que são extraídos através da fundamentação[8]. Não obstante, para além desta valência de proteção jurídica, múltiplas são as funções que a fundamentação realiza, e a sua avaliação funcional possibilita visualizar que esta leitura reflete apenas uma visão parcial do instituto e das suas potencialidades.

 

    Relativamente, à temática sobre o imperativo da fundamentação formal, que está relacionada com a concretização das mais-valias de controlo, advêm da exteriorização dos fundamentos da decisão.

Quanto à dimensão eminentemente subjetiva, que está ligada com a possibilidade da defesa contenciosa, prevê-se na fundamentação uma via de maximização das possibilidades de controlo da atividade administrativa, em termos objetivos.

Esta capacidade de controlo, que, de certa forma, liga-se através de uma técnica de publicidade, através de decisões atomísticas com a totalidade da comunidade, aparece também, estreitamente, conectada com a ideia de clarificação, e esclarecimento dos processos decisórios, que são realizados, justamente, à custa da fundamentação. Não só no aspeto genérico de aferição coletiva, mas também no âmbito dos interessados na decisão, é patente a existência de uma obrigação de narração exterior da ponderação, que por consequência a efetivação de uma clarificação pública da decisão. Esta função é reconhecível, a partir da medida, em que a fundamentação formal vem a consubstanciar uma forma de explicação da decisão[9].

 

    Acrescentando ainda à melhoria da qualidade da decisão, a fundamentação tem como papel ser um meio de prova exterior da correção da decisão. Uma das formas de salvaguardar do impacto da decisão, quer ao nível da sociedade, quer ao nível do círculo dos interessados, é garantir, por via, de explicações presentes na fundamentação, a valência da alternativa adotada, tendo de provar os seus méritos, e realizar o alcance da norma através da justificação, que poderá adquirir um caráter de comparação.

 A fundamentação adquire, assim, uma funcionalidade de prova, que se traduz na justeza da decisão, principalmente através quer da descrição dos atos instrutórios efetuados, quer das valorações procedimentais efetuadas, bem como da narração das considerações de comparação efetuadas, não só através do percurso do procedimento, como também na respetiva decisão.

 

    Em relação direta, com o contexto da fundamentação, o discurso de justificação corresponde também a um propósito de apaziguar as reações,[10] que é resultado do amolecimento da autoridade natural, de uma decisão unilateral, através dos esclarecimentos procedimentais condensados agora no momento de decisão. A fundamentação significa, também, por isso, uma forma de continuar e prolongar do diálogo procedimental, ao realizar a parte final da sucessão de contatos, que é refletida no procedimento administrativo. A função de apaziguamento atinge um nível de esclarecimento elevado, e é efetuada, precisamente, no momento da decisão, acompanhando cronologicamente o processo de publicação, como é definido pela regra geral.

 

    Esta função de apaziguar, protagonizada pela fundamentação, está muito ligada com um aspeto particular, em que a fundamentação aparece como um instrumento de consensualidade.  Tem como objetivo esclarecer não só a comunidade, mas também os interessados, refletindo-se num modo de legitimidade acessória da decisão.

Este aspeto tem como fundamento a ideia de democracia administrativa, que sublinha, efetivamente, a semelhança entre a fundamentação dos atos jurisdicionais, e por outro lado das decisões administrativas, e consubstancia uma das dimensões relacionais das funções relativas à proteção da decisão. Note-se, o propósito a alcançar é que não se protagonize conflitos posteriores, e para que tal não aconteça, é necessária uma capacidade de aproveitamento da fundamentação como mecanismo de consensos[11].

 

   No fundo, a caraterização dos diferentes contextos funcionais da fundamentação formal possibilita a sua respetiva avaliação, da sua dimensão relacional, não se esgotando num mero mecanismo de garantia de proteção jurídica, e de controlo da atividade administrativa.

 Baseia-se numa forma de comunicação, sustentada numa finalidade justificativa que, no entanto, no panorama da relação dialógica própria que estabelece, possibilita a efetivação de uma panóplia de tarefas, que vão para além desse núcleo histórico de compreensão do instituto. É, perfeitamente, plausível reconhecer que, no imperativo da fundamentação exista um ponto de partida, em que se realizam objetivos relacionais, numa ponderação de componentes de garantia e de democratização.

 

   Neste momento, que envolve os diversos atos destinados à identificação e comparação dos vários interesses afetados, e ao estudo das questões em causa, tem lugar a elaboração do projeto de regulamento, que corresponde ao articulado e a respetiva nota justificativa, que apresenta a fundamentação jurídica das posições adotadas, segundo os termos do artigo 99 CPA.

A nota justificativa contêm como base a fundamentação administrativa, que abarca a referência aos interesses públicos envolvidos, o que, por conseguinte, implica a realização de um necessário juízo de ponderação de custos e benefícios. A fundamentação jurídica das medidas que constam de vários diplomas, a qual obriga, naturalmente, à alusão das normas legais, que têm como finalidade sustentar a emissão do regulamento[12]. Se a fundamentação administrativa, além da importância que possui ao nível da interpretação, adquire uma relevância preponderante, em termos, de controlo de mérito e da oportunidade das normas emanadas pelo órgão, permite, no mínimo, o controlo da habilitação[13].

 

  Atualmente, o CPA apresenta uma obrigatoriedade quanto ao teor desta nota justificativa: a referência à análise de custos-benefícios[14].

A previsão da “cost-benefit analysis” na elaboração de normas administrativas significa, neste contexto, uma forma de influência do direito anglo-saxónico, que se tem infiltrado nos ordenamentos jurídicos europeus continentais[15].

Com particular enfoque no panorama da atuação das agências reguladoras, a análise custos-benefícios é, de facto, um mecanismo de controlo do exercício do poder administrativo não só em termos gerais, mas também do poder regulamentar em especial. Não será, por isso, estranho de se considerar, que de entre os vários instrumentos de regulatory review da ação dos reguladores, assuma particular relevância a instituição deste instrumento, particularmente em matérias de índole económica e financeira[16]. Como é normal, a análise dos custos-benefícios não permite avaliar benefícios não monetizáveis ou não quantificáveis, como a dignidade humana ou a segurança, os quais devem constituir, igualmente, alvo de ponderação na emanação dos regulamentos administrativos.

Nestas circunstâncias, a análise custo-efetividade, que abarca a comparação das várias medidas adequadas à satisfação de um determinado fim, e identifica como os mais efetivos aqueles meios que proporcionam menos sacrifícios.

 

  É essencial salientar que a falta dessa nota justificativa, que tem como função, acompanhar o projeto, produz como efeito a invalidade do diploma final, por vício de procedimento.

Na circunstância de se estar, perante uma formalidade essencial, para o adequado desenvolvimento da fase de participação dos cidadãos, a inexistência de fundamentação, de certo modo, prejudica uma esclarecida intervenção dos particulares no procedimento regulamentar. Principalmente, quando na sua participação, está presente o exercício de um direito fundamental, em que é afetado ainda o interesse público da clarificação do poder regulamentar.

 

 “A fundamentação materializa-se num discurso de justificação da decisão que permite entender das ponderações efetuadas dentro de vários parâmetros fácticos e jurídicos envolventes”[17].

 

 A obrigatoriedade de fundamentar apresenta os requisitos, que estão presentes no discurso que serve de justificação: a própria realização da fundamentação, quando devida; a clareza da fundamentação, a congruência da fundamentação e por último a suficiência da fundamentação. Pode-se concluir que ao não se verificar um destes pressupostos de concretização do dever formal, apresenta como consequência um vício da fundamentação, que se relaciona com a desconformidade jurídica da formalidade.

 

   O facto de se verificar um um vício de fundamentação implica, naturalmente, a ocorrência de uma ilegalidade, que está relacionada com a decisão.

Todavia, os vícios da fundamentação poderem dizer mais, relativamente, à correção da ponderação protagonizada, há, no mínimo, desde logo, uma ilegalidade substancial. A questão complicada que se introduz no âmbito do imperativo da fundamentação reside, principalmente, na determinação da forma de invalidade consequente. O alcance da questão alarga-se, na medida em que, a verificação do desvalor jurídico da anulabilidade do ato, poderá conflituar com as consequências derivadas da qualificação jusfundamental, de um eventual direito à fundamentação.

 

    São diferentes as visões em que está moldada, a questão da natureza jurídica do imperativo da fundamentação. Em primeiro lugar, é essencial saber se ao dever de fundamentação formal, corresponde à eventualidade de uma existência de um direito à fundamentação de, que seriam titulares os interessados na decisão. A questão coloca-se, na medida em que, se tem entendido que, embora haja uma inserção sistemática em termos de direitos dos administrados, o dever de fundamentação se traduz num dever não relacional, que se expressa através de uma norma de ação administrativa à qual, não está relacionado um direito dos particulares, dado que estabelece a obrigatoriedade de um comportamento administrativo[18].

 

    A avaliação dos deveres não relacionais estará presente na circunstância de, que só é admissível assumir a sua existência, na eventualidade, em que não estejam em causa interesses diretos de terceiros no cumprimento do dever. No fundo, o exercício dessa norma de ação, não é concebível visualizar a satisfação de um interesse direto, que pertence a um particular, no respetivo exercício da norma.

Portanto, no dever de fundamentação, está sempre no seu campo de aplicação não só a realização de um dever público, mas também um interesse direto de um terceiro, em ter conhecimento, relativamente, à ponderação que está “por detrás” da decisão, que funciona como elemento preponderante, para a compreensão do ato, interesse que advêm, naturalmente, da sua condição de interessado no objeto decisório.

 

   A ratio de um direito à fundamentação, é substanciada pela própria materialidade da posição jurídica subjetiva, em que a sua respetiva avaliação é apurada, no conflito entre a essência formalmente constitucional, e o caráter fundamental que lhe possa assistir. A fundamentação das decisões, que se traduz em vários objetivos de proteção jurídica, e de racionalização da decisão, também é considerado como um elemento procedimental, que é vital para a verificação da plenitude da satisfação, de outras posições fundamentais essenciais, na perspetiva de proteção jurídica.

 

    Na ligação entre a tutela processual e procedimental[19], existem quatro formas autónomas de garantia, que estão, naturalmente, conectadas com a tutela dos direitos fundamentais.

Concretizam-se através da informação procedimental, ao acesso à justiça, bem como o conhecimento dos fundamentos das decisões. De modo a que, se verifiquem, têm de estar reunidas condições reais de ação.

Pode-se observar que, não só mediante do nexo de “acessoriedade” que existe entre uns e outros, existe também um campo próprio de um status activus processualis, que se materializa como uma condição vital de garantia na proteção dos direitos essenciais ao cidadão, como também na valorização autónoma do indivíduo, na sua ligação com os poderes do Estado.

A restrição de uma posição jurídica subjetiva que implica uma vantagem, que está relacionada com a dignidade da pessoa humana, não poderá conduzir como um objeto de decisões, o cidadão, dado que a dignidade abarca direitos não só de procedimento, e de processo, que tem como ratio melhorar a relação jurídica, entre a Administrações e os seus respetivos cidadãos.

 

   Estas avaliações servem para fundamentar, a ideia de que não é só apenas através de elementos interpretativos formais, que o direito à fundamentação das decisões é como um direito fundamental.

A unidade valorativa do sistema tem como base o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, passará também por um conjunto limitado de direitos fundamentais. Tal como o direito à fundamentação, em que o seu aspeto funcional do instituto, que não está relacionado com aspetos de proteção jurídica, não significa que também lhe seja atribuída uma tarefa em que se esclarece devidamente, e que também é essencial para a consideração do indivíduo no âmbito de dignidade.

 

   Não obstante, o direito à fundamentação estar, de certa forma, ligado ao contencioso, permite caraterizá-lo como um direito fundamental autónomo, sendo, assim, um direito, liberdade e garantia semelhantes a esse conjunto de direitos, formalmente qualificados pelo texto constitucional como tal[20].

  A caraterística que satisfaz menos, tendo como base uma perspetiva pragmática, do regime consequente do direito fundamental à fundamentação, pela abrangência quantitativa que proporciona é a consequência da nulidade, para os atos que carecem de fundamentação de, porém não foi realizada. É preciso ter em análise, que só se consideram os atos que contenham nulidade, os que afetem o substrato vital de um direito, liberdade e garantia, o que, nesta temática, diminui substancialmente, as situações em que se verificam a nulidade de um ato por violação do direito fundamental.

 

     O conteúdo de um direito autónomo de tipo procedimental, tal como é o direito à fundamentação das decisões, estará presente no seio central do direito, que tem de salvaguardar um grau de satisfação mínima[21].

 

     Conclui-se que a elaboração defeituosa da fundamentação, não afetará o seu conteúdo vital, uma vez que os vícios da fundamentação relativos a pressupostos internos do discurso justificativo atribuem como sanção a anulabilidade da decisão. Simultaneamente, as caraterísticas de funcionalidade da valoração do direito à fundamentação, que se define como um direito fundamental estão ligados com dois aspetos:  não só de esclarecer o destinatário, mas também garantir a proteção jurídica no acesso ao recurso [22]contencioso.

 De certa forma, não é colocada a questão do substrato nuclear do direito, na eventualidade de haver outra via que assegure uma satisfação desses interesses. Neste caso, o teor material fundamental do direito não é posto em causa, e por consequência a decisão é apenas anulável.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Bibliografia:

 

De Andrade, José Carlos Vieira, O dever de fundamentação expressa de atos administrativos, Almedina Coimbra, 1991, p.11 e 12

 

De Sousa, Marcelo de Rebelo; e De Matos, André Salgado, Direito Administrativo Geral, atividade administrativa, Tomo III, Dom Quixote, 1 edição, 2007

 

Dissertação de mestrado em Ciências jurídico-políticas apresentada na Faculdade de Direito Universidade de Lisboa, 1995; Duarte, David; Procedimentalização, Participação e fundamentação: Para uma concretização do princípio da imparcialidade administrativa como parâmetro decisório, Almedina, Coimbra 1996,

 

Moniz, Ana Raquel Gonçalves; Comentários ao Novo Código do Procedimento Administrativo, Volume II, 2018, 4 edição, AAFDL Editora, p. 26 e 27

 

Moniz, Ana Raquel Gonçalves, A recusa de aplicação de regulamento pela administração com fundamento em invalidade: contributo para a teoria dos regulamentos, Almedina Coimbra, 2012, p.158 e 159

 

Miranda, Jorge; Manual de Dirieto Constitucional, tomo IV, Coimbra Editora, 4ª edição, 2014, pág.308.

 

Canotilho, José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional, Almedina Coimbra, 6ª edição revista, 1993, p.619 e 620



[1] José Carlos Vieira de Andrade, O dever de fundamentação expressa de atos administrativos, Almedina Coimbra, 1991, pp.11

[2] José Carlos Vieira de Andrade, O dever…, Almedina Coimbra, 1991, p.11-12

[3] Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, atividade administrativa, Tomo III, Dom Quixote, 1 edição, 2007, p.248

 

[4] Marcelo Rebelo de Sousa, André Salgado Matos, Dirieto Administrativo Geral …, Dom Quixote, 1 edição, 2007, p. 248

[5] Ana Raquel Moniz, A Recusa de aplicação de regulamento pela administração com fundamento em invalidade: contributo para a teoria dos regulamentos, Coimbra Almedina, 2012, pp. 158

 

[6] Ana Raquel Moniz, A Recusa…, Almedina, 2012, pp. 159

[7] David Duarte, Procedimentalização, participação e fundamentação: para uma concretização do princípio da imparcialidade administrativa como parâmetro, Almedina Coimbra, 1996, pág. 237

[8] David Duarte, Procedimentalização …, Almedina Coimbra, pág. 238

[9] David Duarte, Procedimentalização …, Almedina Coimbra, pág.238

[10] David Duarte, Procedimentalização …, Almedina Coimbra, pág.239

[11] David Duarte, Procedimentalização …, Almedina Coimbra, 1996, pág.240;

[12] Ana Raquel Gonçalves Moniz, Comentários ao Novo Código do Procedimento Administrativo, Volume II, 2018, 4 edição, AAFDL Editora, p. 26

[13] Cf. Ana Raquel Moniz, Comentários…, Volume II, 2018, 4 edição, AAFDL Editora, p.26

[14] Cf. Ana Raquel Moniz, Comentários…, Volume II, 2018, 4 edição, AAFDL Editora, p.27

 

[16] Cf. Ana Raquel Moniz, Comentários…, Volume II, 2018, 4 edição, AAFDL Editora, p.27

[17] David Duarte, Procedimentalização…, Almedina Coimbra, 1996, p.224

[18] David Duarte, Procedimentalização…, Almedina Coimbra, 1996, p.224

[19] David Duarte, Procedimentalização…, Almedina Coimbra, 1996, p.230

[20] David Duarte, Procedimentalização…, Almedina, Coimbra, 1996, p. 231;

[21] David Duarte, Procedimentalização…, Almedina Coimbra, 1991, pág. 232; referindo que o conteúdo essencial tem de ser entendido como o limite absoluto correspondente á finalidade ou valor que justifica o direito, Jorge Miranda, Manual de Dirieto Constitucional, tomo IV, cit., pág.308. vide também Gomes Canotilho, Direito Constitucional, cit. págs. 619 e 620.

[22] David Duarte, Procedimentalização…, Almedina Coimbra, pág.232

 

 

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