O
Princípio da Boa Administração
Trabalho elaborado para a Unidade
Curricular de Direito Administrativo
regida pelo Professor Doutor Vasco
Pereira da Siva e assistida pelo
Doutor Jorge Pação
João Pedro Neutel Freitas, aluno nº
68349, 2º ano, turma B, sub 15
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Princípio da Boa
Administração
A administração pública
sempre teve como missão primordial gerenciar os recursos e os serviços estatais,
visando promover o interesse público e, por conseguinte, o bem-estar social. No
entanto, o foco não reside tanto na definição da administração pública, mas sim
em compreender a forma como a Administração opera dentro da realidade social
globalizada e assim entender quais são os mecanismos de atuação na sociedade.
Na era da globalização, a
administração pública enfrenta desafios multifacetados. De facto, esta não se
limita só a lidar com as questões locais, mas passou também a considerar as
interconexões e interdependências entre os diferentes países. Neste contexto, a
administração pública precisa de se dotar de abordagens mais flexíveis e
inovadoras para enfrentar questões, tais como o comércio internacional, a migração,
as mudanças climáticas e a segurança global. Atualmente,
a tecnologia desempenha um papel crucial na metodologia como a administração
pública opera na sociedade globalizada. Por um lado, a digitalização dos
serviços públicos pode aumentar a eficiência, melhorar o acesso dos cidadãos
aos serviços e promover a transparência e a prestação de contas. Por outro
lado, isso também levanta questões relacionadas com a privacidade e com a
segurança dos dados, que precisam ser cuidadosamente gerenciadas, sendo a
proteção de dados uma das principais bandeiras dos Estados
Outro
aspeto a ter em conta é a colaboração entre os diferentes níveis de governo, bem
como entre o governo e as partes interessadas da sociedade civil e do setor
privado. A abordagem de governança pública em rede, que envolve parcerias e
cooperação entre os diversos intervenientes, torna-se cada vez mais relevante
na busca por soluções para problemas complexos que ultrapassam fronteiras
nacionais. Sendo assim, a administração pública na realidade social globalizada
precisa ser ágil, colaborativa e orientada para resultados, buscando assim
soluções inovadoras e adaptativas para os desafios contemporâneos.
Para
garantir o bem-estar social, a administração pública que pertence ao poder
executivo numa lógica de separação de poderes atua através de princípios. De
facto, os princípios administrativos são conceitos que estabelecem valores ou
regras básicas que devem orientar a conduta e a tomada de decisões tanto no
setor público como no privado. Assim, são diretrizes fundamentais que visam
garantir o bom funcionamento da organização e a prestação de serviços de forma
organizada e eficiente.
Em primeiro lugar, pode-se considerar o princípio administrativo da igualdade, consagrado no Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de janeiro, mais conhecido como Código de Procedimento Administrativo, no seu artigo 6º, que estabelece que a Administração Pública deve pautar as suas relações com os particulares pelo mesmo. Isso significa que não pode privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever ninguém com base em ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação econômica, condição social ou orientação sexual.
Em segundo lugar, cumpre mencionar o princípio administrativo da imparcialidade, presente no Artigo 9º do Código de Procedimento Administrativo (CPA). Este princípio estabelece que a Administração Pública deve tratar de forma imparcial aqueles com quem ela se relaciona, considerando de forma objetiva apenas os interesses relevantes no contexto decisório e adotando soluções organizativas e procedimentais necessárias para preservar a isenção administrativa e a confiança nessa isenção.
Em terceiro lugar, cumpre
mencionar o princípio que vincula o âmbito desta exposição: o princípio da Boa
Administração. De facto, este princípio é fundamental para compreendermos como
a Administração Pública atua e qual a importância de uma gestão eficaz nas
decisões administrativas, tanto no setor público quanto no privado. Este
princípio tem três vertentes distintas, mas interligadas, que contribuem para
caracterizá-lo de maneira abrangente. Primeiramente,
a eficiência é uma das vertentes essenciais da Boa Administração. Isso implica
utilizar os recursos disponíveis de forma racional e produtiva, buscando
alcançar os objetivos estabelecidos de maneira eficaz e com o mínimo
desperdício possível. A eficiência na administração pública resulta em serviços
de melhor qualidade e custos reduzidos para a sociedade, dando melhores e mais
qualificados serviços.
Em
segundo lugar, um dos pilares fundamentais dentro daquilo que é a Administração
Publica é a transparência, sendo esta uma vertente crucial para que possa a
Administração ser idónea. Uma administração transparente traduz-se em decisões
e processos administrativos onde a clareza deve imperar, acessíveis e
compreensíveis para todos os envolvidos, sejam eles cidadãos, empresas ou
outras instituições. De facto, a transparência promove a prestação de contas e
fortalece a confiança nas instituições governamentais.
Por último, a responsabilidade é a terceira
vertente do princípio da Boa Administração.
Envolve a prestação de contas pelos atos e decisões administrativas,
tanto perante os órgãos superiores de controle quanto perante a sociedade em
geral. Uma administração responsável garante que os gestores públicos sejam
responsabilizados pelas suas ações e que os interesses públicos sejam
protegidos.
Deste
modo, pode-se afirmar que as três vertentes da Boa Administração orientam a
identificação de situações que possam promover uma gestão eficiente e benéfica
para a realidade social em questão. Ao seguir esses princípios, a administração
pública pode atuar de maneira mais eficaz e contribuir para o bem-estar da
sociedade como um todo.
Compreender o princípio
da boa administração requer uma análise aprofundada dos seus conceitos
fundamentais, discussões subjacentes e implicações de sua violação. Este
princípio está intrinsecamente ligado a ideias como eficiência, transparência e
responsabilidade na gestão dos recursos públicos e na tomada de decisões
administrativas. A eficiência refere-se à capacidade de alcançar os
objetivos estabelecidos de forma eficaz, utilizando os recursos disponíveis de
maneira racional e produtiva. Uma administração eficiente é capaz de maximizar
os resultados com o mínimo desperdício de recursos. A transparência é
outro elemento chave da boa administração, garantindo que as decisões e
processos administrativos sejam claros, acessíveis e compreensíveis para todos
os interessados. Isso promove a prestação de contas e fortalece a confiança nas
instituições governamentais.
A responsabilidade
complementa o princípio da boa administração, exigindo que os gestores públicos
sejam responsabilizados por suas ações e decisões perante os órgãos de controle
e a sociedade em geral. Uma administração responsável garante que os interesses
públicos sejam protegidos e que os gestores sejam responsáveis por seus atos.
As discussões em torno
deste tema variam desde a sua eficácia como princípio orientador da
administração do Estado até as formas de implementação e avaliação de sua
aplicação na prática. Além disso, questões relacionadas à ética, à governação e
ao papel do Estado na sociedade são frequentemente debatidas no contexto do
princípio da boa administração.
Caso este princípio seja violado,
podem surgir diversificados problemas, como o mau uso dos recursos públicos, a
falta de prestação de contas e a perda de confiança na administração pública.
Isso pode levar a consequências sérias, como processos judiciais, danos à
reputação das instituições e, em última instância, prejuízos para a sociedade
como um todo. Dessa forma, o princípio da boa administração é de grande
relevância no sistema administrativo, promovendo discussões essenciais sobre a
qualidade da gestão pública, a responsabilidade dos gestores e a promoção do
interesse público.
Para entendermos verdadeiramente o princípio da boa administração, é necessário primeiro compreender o conceito de uma administração eficaz. Uma "boa administração" seria aquela que é responsável na ética e gestão de recursos, tomando decisões estratégicas e inteligentes para estabelecer metas e gerenciar com responsabilidade e transparência de leis e regulamentos aplicáveis. Em suma, uma boa administração está diretamente relacionada ao conceito de eficiência. Este princípio, como o nome sugere, constitui o âmago das formas de atuação jurídica da administração pública, determinando as ações tanto externas quanto internas. Além disso, o Princípio da Boa Administração é crucial para o adequado funcionamento do Estado e a promoção do bem comum. Ele garante que a atuação dos órgãos públicos seja regida por valores como eficiência (realização de atividades com a melhor utilização dos recursos disponíveis, visando sempre os melhores resultados), eficácia (capacidade de produzir os resultados pretendidos), legalidade (princípio que estabelece que a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite, em conformidade com as leis e normas em vigor) e moralidade (este princípio estabelece que a Administração Pública deve agir com ética e honestidade em todas as suas atividades, fundamentando-se em valores morais e respeitando os princípios de justiça e boa-fé regulados no CPA.
Conforme mencionado anteriormente, o princípio da boa administração está intrinsecamente ligado à eficiência, o que não se limita apenas ao seu título, mas também é evidenciado pelo seu núcleo no CPA, no artigo 5º: “A Administração Pública deve pautar-se por critérios de eficiência, economicidade e celeridade.”
Além disso, o princípio
da Boa Administração também está presente no artigo 41º da Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia, que tem como epígrafe “O direito a uma boa
administração”. É imperativo respeitar esta carta, uma vez que, de acordo com o
Tratado de Lisboa de 2009, Portugal também adere aos direitos e deveres
estabelecidos nela.
Retomando o tema da
eficiência subjacente ao princípio da boa administração, podemos observar que,
logo no primeiro ponto do artigo 5º do CPA, além do critério da eficiência, o
princípio da boa administração está relacionado a outros conceitos como a economicidade
e a celeridade. Estas seriam, então, as três vertentes que delineiam o
princípio da Boa Administração: eficiência, celeridade e economicidade.
Podemos explicar esses
conceitos interligados dizendo que, por exemplo, a eficiência é a capacidade de
realizar uma tarefa com o mínimo de desperdício de recursos, tempo e esforço. É
alcançada quando uma atividade é executada da melhor maneira possível, utilizando
os recursos disponíveis de forma produtiva e obtendo-se resultados
satisfatórios. Em outras palavras, a eficiência mede a relação entre a
quantidade de recursos empregados e os resultados obtidos. Por sua vez, a
economicidade pauta-se pela redução máxima dos custos, ou seja, visa a obtenção
do melhor resultado com o menor custo possível, tratando da busca pelo
equilíbrio entre eficiência e eficácia, de forma a maximizar o uso dos recursos
disponíveis e minimizar o desperdício. Sendo assim, é fundamental tanto no
setor público quanto no privado, uma vez que garante sustentabilidade e um
maior desenvolvimento econômico juntamente com um resultado eficaz. A
celeridade, por sua vez, refere-se à qualidade ou característica de ser rápido,
ágil ou diligente. Usualmente é utilizada no contexto de processos,
procedimentos e decisões, definindo que estes devem ser realizados com rapidez
e agilidade. A celeridade pode ser um fator importante em várias áreas além da
administração pública, sempre que seja exigida rapidez e tomada de decisão ágil
e útil.
Por sua vez, o número
dois do artigo 5º do CPA, revela que o princípio da Boa Administração
deve orientar-se por uma organização que aproxime os serviços da população e,
além disso, de forma não burocratizada. Em outras palavras, o CPA estabelece
uma diretriz para que os serviços públicos sejam prestados de modo que a
população possa participar deles, tornando assim a relação da administração
pública com o público mais eficiente e acessível. Isso significa que os
serviços públicos devem ser organizados de forma a reduzir a burocracia e
simplificar os procedimentos administrativos, tornando-os mais ágeis e,
consequentemente, mais fáceis para os cidadãos. Além disso, devem ser
oferecidos de forma mais próxima das pessoas, garantindo assim maior
efetividade e atendimento às necessidades da população.
Neste contexto, podemos
afirmar que o Código de Procedimento Administrativo tem como objetivo
esclarecer que o Princípio da Boa Administração, além de estar associado e
vinculado a princípios como celeridade, economicidade e eficiência, também deve
demonstrar uma disposição para melhorar a qualidade e eficácia dos serviços
prestados pela Administração Pública aos cidadãos, através de uma maior
proximidade da população com a Administração Pública e evitando que o processo
seja burocrático, mas sim prático, simples, eficiente e ágil.
Além de caracterizar o
princípio da boa administração com as três vertentes mencionadas acima, é
importante mencionar que na doutrina há frequentemente uma discussão sobre se a
boa administração seria um princípio ou um dever administrativo.
Nesse sentido, alguns
autores afirmam que o princípio da boa administração é também um dever
imperfeito, uma vez que os tribunais têm competência apenas para tutelar a
legalidade das decisões, e não o mérito das mesmas, o que significa que não
existe uma sanção jurisdicional que permita controlar juridicamente as decisões
administrativas. No entanto, uma parte da doutrina apresenta o princípio da boa
administração como um dever jurídico, como é o caso do professor Diogo Freitas
do Amaral, que enfatiza sua opinião apresentando exemplos para mostrar sua
juridicidade, como a existência de impugnações administrativas, como recursos e
reclamações. Ele ainda destaca que se houver violação de deveres de zelo por
parte de um funcionário público, isso constitui uma infração disciplinar que
pode levar a sanções para o mesmo. Ou no caso de um órgão administrativo
praticar um ato ilícito e culposo que resulte em prejuízos para terceiros, o
grau de diligência e zelo empregado na ação contribui para definir a medida da
culpa e responsabilidade do agente ou órgão.
Entretanto, há também na
doutrina outra discussão sobre o Princípio da Boa Administração, que é saber se
a observância deste princípio pode ser controlada pelos tribunais, uma vez que,
considerando seu conteúdo, a anulação de um ato administrativo consagra apenas
um dever jurídico imperfeito, não permitindo a anulação de um ato
administrativo apenas com base em sua violação. No entanto, a Administração
pode incorrer em responsabilidade civil pelos danos causados aos particulares
sempre que infringir este princípio. Neste contexto, é importante salientar o
que aconteceria caso o princípio da boa administração não fosse seguido.
De facto, os tribunais
administrativos controlam os atos, não o mérito, sendo assim, estes tribunais
não conseguem controlar rigorosamente o princípio da boa administração em todos
os casos. Contudo, há uma parte da doutrina que defende que existe um princípio
para controlar este princípio da boa administração, como é o caso do professor
Paulo Otero, ao afirmar que o princípio da proporcionalidade controla o
princípio da boa administração. Todavia, há outra parte da doutrina que
discorda do professor, como é o caso da professora Sandra Lopes Luís, ao
afirmar que o princípio em questão, defendido pelo professor Paulo Otero como
fiscalizador, é sim um princípio, mas não uma forma de fiscalização, e é por
este facto que o chamam de um dever jurídico imperfeito.
No entanto, se o
princípio da boa administração não for seguido, ou seja, se a administração
pública não atuar de maneira adequada, isso pode resultar em várias situações
prejudiciais à administração pública. Pode haver falta de transparência nas
ações e decisões tomadas, má utilização dos recursos públicos e ineficiência na
prestação de serviços, além da violação dos direitos dos cidadãos. Estas
questões podem gerar sanções administrativas e tornar o ato inválido. Se o ato
em questão agir em desacordo com o princípio da boa administração, isso poderia
tornar o ato nulo, ou seja, deixará de produzir efeitos jurídicos desde o
início de sua produção. Ações que resultem em vícios que tornem o ato ilegal,
falta de competência do agente público ou violação das leis ou direitos
fundamentais podem levar à nulidade do ato, de acordo com o artigo 161º do CPA.
Conclui-se, portanto, que
o texto acima discute e apresenta a importância dos princípios administrativos
que orientam o setor público para garantir uma gestão eficaz e eficiente,
visando um bom resultado para a realidade social comum. O princípio da igualdade,
que impede qualquer forma de discriminação, e o princípio da imparcialidade,
que exige tratar a todos de forma justa, são destacados como exemplos de
princípios administrativos. Além disso, é explorado o conceito do princípio da
Boa Administração, essencial para o funcionamento do Estado e para a promoção
do bem comum da sociedade. Este princípio inclui valores como eficiência,
eficácia e economicidade, mas também está indiretamente vinculado a outros
valores como legalidade, moralidade e eficácia. Também é enfatizada a questão
de compreender o que é uma boa administração, revelando que esta deve gerir
recursos de forma ética e estratégica, estabelecer metas e gerir leis e
regulamentos de forma transparente, mas concisa e eficiente. O princípio da Boa
Administração é um elemento fundamental do sistema de administração pública,
que gera diversas discussões sobre sua natureza e aplicação. Violá-lo pode
gerar graves consequências tanto para o agente público quanto para a sociedade,
comprometendo a justiça, a igualdade e o bem-estar social.
Assim, é crucial
preservar o princípio da Boa Administração para garantir uma sociedade bem
administrada, onde os interesses dos cidadãos são primordiais na tomada de
decisões e na promoção do bem comum.
Bibliografia
AMARAL, Diogo Freitas,
Curso de Direito Administrativo, volume II, 4ª edição, 2018, Almedina.
SILVA, Vasco Pereira, Em
busca do ato administrativo perdido.
DE SOUSA, Marcelo Rebelo,
«Regime do Acto Administrativo», in Direito e Justiça, vol. VI.
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