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sábado, 25 de novembro de 2023

 

PLANO DE PREVENÇÃO DE RISCOS DE GESTÃO, INCLUINDO OS DE CORRUPÇÃO E INFRAÇÕES CONEXAS

As políticas anticorrupção têm vindo a ganhar uma relevância cada vez maior na construção de uma sociedade que se pretende que seja estatuída pela prossecução do interesse público, pela igualdade, responsabilidade, transparência, proporcionalidade, imparcialidade, justiça e boa-fé. Reflete-se assim, numa tentativa de criar ou consolidar laços de confiança sólidos entre os cidadãos e as suas instituições democráticas.

RISCOS DE GESTÃO

Primeiramente, e antes de desenvolver o mecanismo inovatório de combate ao exercício corrupto, importa conhecer de uma forma clara os crimes que motivaram a criação deste regime. No caso, a corrupção e as infrações conexas, previstas no art.3º do Regime Geral da Prevenção da Corrupção (RGPC) e no Código Penal, correspondem à prática interposta de um ato lícito ou ilícito por um terceiro ou pelo próprio sujeito, bem como a sua omissão, em troca de uma compensação que não seja devida para o próprio ou para uma terceira pessoa. Conclui-se assim, que são crimes afetos a um exercício corrupto e entre estes, inclui-se um elo vasto de delitos, nomeadamente, o recebimento e a oferta indevidos de vantagem peculato, a participação económica em negócio, abuso de poder, tráfico de influência, branqueamento ou fraude na obtenção, desvio de subsídio, subvenção ou crédito. Acresce ainda a esta panóplia de crimes, a prevaricação, em que o titular de um determinado cargo conduz ou decide de determinada forma um processo com o objetivo de prejudicar ou beneficiar alguém. A concussão, ainda como crime associado à criação deste regime, é definida como a prática em que uma pessoa, no exercício das suas funções ou dos seus poderes, exige receber vantagem indevida.

REGIME GERAL DA PREVENÇÃO DA CORRUPÇÃO E PPR

No sentido de criar um instrumento de prevenção para os crimes anteriormente referidos, foi aprovado o Decreto-lei n.º109-E/2021, de 9 de dezembro, que vem estabelecer o Regime Geral da Prevenção da Corrupção (RGPC). Este regime, tal como previsto no art.2 nº1 RGPC, é dirigido a um conjunto de entidades, entre as quais, todas as pessoas coletivas com sede em Portugal, que empreguem pelo menos 50 trabalhadores, e às sucursais, em território nacional, de pessoas coletivas com sede no estrangeiro que empreguem a mesma quantidade de trabalhadores exigida anteriormente. Acrescem a estas, os serviços e as pessoas coletivas da administração direta e indireta do Estado, das regiões autónomas, das autarquias locais e do setor público empresarial com pelo menos 50 trabalhadores, as entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo, bem como o Banco de Portugal.

Trata-se assim, de um conjunto de entidades que adotam e implementam um programa de cumprimento normativo, previsto no art.5 nº1 RGPC, onde se inclui por exemplo, um código de conduta, um programa de formação e um canal de denúncias. Embora todos estes desempenhem um papel fundamental na prevenção, regulação e fiscalização de atos de corrupção e infrações conexas, focar-me-ei na implementação do Plano de Prevenção de Riscos de Corrupção e Infrações conexas (PPR), previsto no art.6º RGPC.

Consiste num plano que tem como finalidade, ao abrigo do art.6 nº1 a) RGPC, identificar, analisar e classificar os riscos e as circunstâncias suscetíveis de verificar os crimes referidos anteriormente. Acresce ainda, o objetivo de prevenir e detetar um risco que, inevitavelmente, se encontra associado a uma atividade, através da aplicação de medidas preventivas e corretivas, previstas no art.6 nº1 b) RGPC. No caso de este já se verificar, tem como objetivo identificar as suas consequências ou ameaças ao sucesso, bem como sancionar os possíveis atos de corrupção e infrações conexas.

Importa salientar o facto desta gestão do risco, ou seja, deste processo de análise metódica dos riscos inerentes às atividades praticadas pelas entidades abrangidas por este regime, dizer respeito a toda a organização e atividade da respetiva entidade, tal como consta no art.6 nº1 RGPC, nomeadamente, às áreas de administração, operacionais e de suporte. Assim sendo, este controlo não é exercido apenas pelo responsável do plano, que deve exercer as suas funções permanentes de forma autónoma, mas também por todos os dirigentes e trabalhadores. Devem exercer a sua atividade de forma ética, estando alertados para a forma de melhor contribuírem para a melhoria contínua da gestão do risco, para as implicações inerentes à sua participação em determinadas atividades, bem como à aplicação do plano e a comunicação ao superior hierárquico de possíveis falhas e riscos. Riscos estes que podem passar pelo tratamento preferencial, favorecimento, falta de isenção e imparcialidade, e que podem estar associados a um conjunto de potenciais áreas de risco como a contratação pública, a gestão administrativa e financeira, a emissão de pareceres e a análise transversal à organização.

PRÓS E CONTRAS DO PPR

Depois de feita uma análise cuidada deste instrumento de prevenção, sujeito a controlos como à elaboração de um relatório de avaliação intercalar, previsto no art.6 nº4 a) RGPC, à elaboração de um relatório de avaliação anual, ao abrigo do art.6 nº4 b) RGPC e a uma revisão prevista no nº5 do art.6º RGPC, concluo que são vários os prós e os contras deste método que funciona a par do Código de Ética e Conduta, dos Canais de Denúncia de Corrupção, do Plano de formação e comunicação e da Declaração de política antifraude.

Tendo em consideração que o PPR se trata de um instrumento ainda muito recente, visto que, o respetivo decreto-lei que o prevê foi aprovado em 2021, considero que ainda tem muito para evoluir. Embora seja um mecanismo de extrema importância no exercício da atividade administrativa, é normal que no futuro venha a sofrer alterações e adaptações, até porque as circunstâncias, ao longo do tempo, assim o exigem. Outro aspeto que pondero ser negativo na aplicação deste plano revela-se no facto das pessoas, na sua generalidade, terem ainda uma formação primária quanto a esta matéria. Daí, ser complexo o desafio por parte de cada funcionário em desenvolver o seu papel neste plano preventivo.

Por outro lado, destaco diversas as vantagens a retirar deste mecanismo. Diria em primeiro lugar, que se trata de um instrumento fundamental na prevenção e na diminuição da suscetibilidade a crimes relacionados à corrupção e a infrações conexas, procurando minimizar a sua ocorrência, bem como o seu impacto negativo. Existindo este plano de prevenção rigoroso, é certamente promovida uma cultura de serviço público, na medida em que todos os funcionários de uma entidade contribuem ou devem contribuir da forma mais eficiente possível para as finalidades pretendidas pelo PPR. A maior eficiência e clareza na atividade administrativa e em todo o exercício praticado pelas entidades abrangidas é certamente, e no meu ponto de vista, um dos aspetos mais vantajosos deste plano. Da mesma forma, a suscetibilidade dos funcionários caírem na “tentação” de participar em atividades com implicações negativas, irá diminuir consideravelmente, atendendo à fiscalidade autónoma e rigorosa. Por fim, e tal como introduzi no meu comentário, irá ser fomentada uma cultura de clareza e transparência, bem como irão ser consolidados laços de confiança sólidos entre os cidadãos e as suas instituições democráticas.

O PPR NA CONSTRUÇÃO DO SENTIDO DE JUSTIÇA

Pelo facto do Plano de Prevenção de Riscos de Gestão, incluindo os de corrupção e infrações conexas, ser aplicado por exemplo, às entidades administrativas, seja de administração direta, indireta ou autónoma, concluo que realmente este instrumento se revela fundamental no âmbito da cadeira em que este comentário é desenvolvido. Sendo o Direito Administrativo, segundo o Senhor Professor Paulo Otero, o “ordenamento jurídico típico, comum e matriz de regulação da Administração pública ou do exercício da função administrativa”1, parece-me de extrema importância a implementação e execução deste plano, na medida em que irá facilitar todo o exercício prosseguido pelo mesmo. Irá contribuir para alcançar a transparência e credibilidade pretendidas, tornando o exercício do Direito Administrativo mais credível, viável e eficaz. As autarquias, que exercem a sua administração autónoma, são um claro exemplo da importância deste instrumento de gestão fundamental e de grande utilidade. Existindo uma autarquia coesa, transparente e pouco suscetível a ser alvo de crimes de corrupção e infrações conexas, mais eficaz será o exercício desenvolvido pela mesma, que passa sobretudo, pela prossecução do interesse público da sua população. Isto é, pelo interesse local. Concluo assim, que o PPR, desenvolvido no âmbito do Regime Geral da Prevenção da Corrupção, será o ponto de partida para construir uma sociedade estatuída pela transparência, boa-fé e por um verdadeiro sentido de justiça.

1 OTERO, Paulo, Manual de Direito Administrativo, Vol.1, Almedina, 2013, 1.4.10 B), pág.32


Bibliografia e Webgrafia:

» Direção-Geral das Autarquias Locais, “Plano de Prevenção de Riscos de Gestão, incluindo os de Corrupção e Infrações Conexas”, novembro de 2021, Portal Autárquico - Plano de Prevenção de Riscos de Gestão, incluindo os de Corrupção e Infrações Conexas (dgal.gov.pt);

» Inspeção-Geral de Finanças- Autoridade de Auditoria, “Plano de Prevenção de Riscos de Gestão”, dezembro de 2021, Inspeção-Geral de Finanças (igf.gov.pt);

» Gabinete Nacional de Segurança, “Plano de Prevenção de Riscos de Corrupção e Infrações Conexas”, 20231011-plano-prevencao-riscos-corrupcao-infracao-conexas.pdf (gns.gov.pt).

 

Margarida Lopes, nº 67994, Turma B, subturma 15

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