Trabalho realizado por: Bernardo Zurzica Dias,
subturma 15; nº aluno: 67949
Este
trabalho tem como propósito analisar a evolução da Administração Clássica, para
uma nova Administração contemporânea, que traz consigo grandes desafios e
problemas, que originam dúvidas em várias áreas do agir administrativo.
Transformação
da Administração: uma nova Administração?
Efetivamente, nas últimas décadas do século
XX, e, principalmente, neste século, tem-se verificado um exponencial
desenvolvimento tecnológico nos domínios da informática, que permitiu afirmar
que existiram quatro fases de alteração da sociedade contemporânea, segundo
Otero (2013).
A
progressiva utilização de “ferramentas” computadorizadas quer de tratamento,
quer de armazenamento de informação, possibilita várias conexões, interações e
também uma gestão mais eficaz e célere de informação desmaterializada. A
democratização do computador pessoal permite a qualquer pessoa o acesso, a
qualquer momento em todos os locais, à informação. A conexão à internet, que
provocou o fenómeno do surgimento de redes sociais, garante uma rápida
circulação de informação, que culmina numa globalização intensa, dissipando as
longas distâncias de várias partes do globo, sem necessidade de contactos
físicos entre os seus membros.
A sociedade de informação que hoje está em
vigor tornando quase arcaica e disfuncional a utilização do papel na
comunicação de mensagens, o que leva por consequência, não só à
desmaterialização da informação, mas também à simplificação da linguagem
escrita, e porventura à sua substituição por imagens ou símbolos universais de
comunicação, dissipando, praticamente, as fronteiras e “pondo a nu” a
ineficácia dos mecanismos clássicos de intervenção do Estado perante os permanentes
desafios do ciberespaço. No fundo, esta súbita e brusca evolução das modernas
sociedades, revelam um domínio da vida social conquistada pela Informática, e
por contágio produziu inevitáveis efeitos na Administração Pública.
A
introdução da tecnologia no seio da Administração Pública, alterou,
profundamente, o seu relacionamento com os cidadãos. Surgiram novos mecanismos
e institutos jurídicos que, progressivamente, nas duas últimas décadas,
revelaram uma nova Administração, culminando na informatização da Administração
Pública, que introduziu mais inovações que os últimos dois milénios, bastante
curioso esse facto. A Administração Clássica foi cedendo lugar, num processo
ainda em pleno desenvolvimento e aprofundamento, a uma Administração Pública
eletrónica, que atualmente vigora com eficácia plena.
Quais
as principais manifestações de um tal processo de informatização da
Administração Pública?
É
possível determinar várias fases da informatização administrativa passou de uma
primeira fase, designada de “computador-arquivo”, para uma nova fase, do “computador-funcionário”,
permitindo, atualmente, em casos de predeterminação por via de programação de
computador, a adoção de “atos administrativos informáticos”, englobando também
a existência de conceitos jurídicos indeterminados e de poderes
discricionários, que surgem como áreas de exclusão decisória informatizada.
A
armazenagem, a gestão e a utilização da informação administrativa é atualmente,
efetuada por meio de mecanismos informatizados, que desemboca numa
desmaterialização do procedimento decisório, sendo notórios altos níveis de
implantação da Administração eletrónica nos seguintes setores: administração
tributária ou fiscal, segurança social, sistema público de saúde, contratação
pública, registo civil, criminal e predial, justiça, setor financeiro e
bancário, universidades públicas.
Cada vez mais, o acesso dos cidadãos à
Administração é realizado, com maior frequência, através de portais da
internet. É importante sublinhar que a resposta administrativa é enviada por
notificação eletrónica, utilizando uma assinatura digital. Nota-se um
progressivo processo de desmaterialização do agir administrativo, sendo isso
patente na indicação da morada que é alterada pela indicação do endereço
eletrónico. Por exemplo, na publicação eletrónica dos boletins oficiais de
legislação são divulgados online atos jurídicos ou simples informação
administrativa, que, assumem, naturalmente, um caráter vinculativo para a
Administração Pública e que para que seja permitida um acesso mais facilitado,
de uma forma genérica de todos os cidadãos ao seu conteúdo, que permite
facilitar o controlo público do agir administrativo. Por fim, os livros em
suporte de papel que realizam compilações ou coletâneas de legislação, de
decisões administrativas e de sentenças judicias estão a ser substituídos pela
informação resultante de “sites da net” geridos por entidades públicas ou por
“e-books”. Nesta longa enunciação, é bastante percetível, que tem ocorrido
transformações substanciais com o desenvolvimento da de uma Administração mais
informatizada.
Uma questão, bastante pertinente de se colocar é,
se será a Administração eletrónica um lugar de vantagens, em termos
comparativos com o modelo tradicional, com perigos, riscos ou desvantagens?
Naturalmente, que nem todas as mudanças, por
via da integração de mecanismos eletrónicos, correspondem, totalmente, a
verdadeiras vantagens.
De facto, pode-se verificar que há um acesso mais
facilitado à Administração, porém, os cidadãos deixam de encontrar do outro
lado uma pessoa no seu estado físico, tornando-se, assim, num ambiente de total
impessoalidade, e este fenómeno conduz à desumanização da Administração
Pública. Efetivamente, existe uma maior eficiência e rapidez numa decisão
desmaterializada, contudo não fazem dissipar uma genérica desconfiança dos
cidadãos perante tecnologias que tendencionalmente não dominam, nomeadamente os
“analfabetos digitais” e os idosos, o que provoca, uma desconfiança das pessoas,
são exemplos disso, o desaparecimento da informação ou de um acesso indevido de
terceiros, pondo em causa a fidelidade do sistema de segurança. Poderá
colocar-se a questão, e com plena legitimidade, se, porventura, os cidadãos se
sentem menos cidadãos perante uma realidade administrativa que desconhecem. Eventualmente,
o dissipar das distâncias territoriais poderá traduzir-se numa leitura negativa,
correspondendo a um obstáculo que afasta a aproximação física dos serviços às
populações, que leva à implementação de aparelhos organizadores centralizados
de decisão, e por via, dessa situação, a Administração eletrónica corre o risco
de se tornar um instrumento contrário a princípios organizadores da própria Administração.
Sublinhe-se que o reforço da igualdade decisória,
extraída dos mecanismos de uniformidade da Administração eletrónica, pode
conduzir a um profundo acelerar de desigualdades entre cidadãos, nomeadamente entre
aqueles que têm acesso aos meios tecnológicos e todos os restantes cidadãos
que, por razões de idade, educação ou local de residência, não lhes é permitido
o contacto com meios informáticos. É importante de salientar que nunca a
Administração eletrónica poderá servir de “utensílio” de discriminação entre
novos e velhos, residentes em zonas urbanas e residentes em zonas rurais, entre
instruídos e “analfabetos digitais”.
Note-se que até a redução de custos de
funcionamento, por via da Administração eletrónica, se revela aparente, uma vez
que tem sempre de existir um avultado investimento em múltiplos equipamentos
informáticos, sucessivamente, renovados a um acelerado ritmo de desatualização,
ampliado pela necessária formação profissional dos operadores administrativos,
reduzindo postos de trabalho, a implementação e a manutenção de uma
Administração tem custos financeiros e sociais superiores à “Administração”.
É
relevante mencionar que no campo essencialmente técnico, tendo presente a
diversidade de máquinas e de programas informáticos, há ainda a registar
problemas de compatibilidade ou interoperatividade de equipamentos e de
programas, impedindo a interconexão de redes e as inerentes impossibilidades de
interação por via eletrónica, isto a três distintos níveis: no interior das
diversas Administrações Públicas de âmbito nacional, entre a Administração
nacional e a Administração da União Europeia e as Administrações dos restantes
Estados-membros, e entre todas as diversas Administrações públicas e os
cidadãos.
É extremamente importante, a normalização, de
maneira que haja uma estandardização de equipamentos e aplicações informáticas,
para que se proporcione uma melhor conectividade entre as diferentes
Administrações e a sua relação com os cidadãos.
A construção de uma rede comum de “diálogo
eletrónico” origina dificuldades no funcionamento não só no âmbito da
cooperação dento da Administração, mas também da regulação para além do seu
meio. Culminando na imposição unilateral de um único modelo de compatibilidade
ou interoperatividade de equipamentos e programas, colidindo com garantias
constitucionais de autonomia (pública e privada) de decisão, sendo já
considerada uma tarefa que incumbe ao legislador.
De facto, é alarmante a incidência deste novo
modelo, o da Administração eletrónica, que suscita riscos e perigos no
armazenamento e tratamento de dados pessoais. Por questões relacionadas com o
intervencionismo do Estado Social e de preocupações de segurança, a
Administração Pública detém um sistema que engloba não só informações pessoais,
mas também patrimoniais de cada cidadão, que origina bancos de dados pessoais
que podem fornecer em rede, suscitando problemas relacionados com a reserva da
vida privada. Contudo, existem zonas de proibição que estão, claramente,
ligadas ao modelo político democrático.
Um dos
grandes debates que estão na ordem do dia ligado com a progressiva implementação
da inteligência artificial, é o seu conflito com a ética, que se resume, em
traços bastante gerais, num “receio de que os robôs possam sobrepor-se aos
seres humanos”.
Para que não seja um tema que suscite muitas
dúvidas e inseguranças, é vital assegurar que certos princípios, como são os
direitos fundamentais, sejam totalmente respeitados, no atuar no direito
administrativo, ou seja, no seu procedimento, sempre que estiver em causa a
utilização de tecnologia nesse procedimento. No fundo, esta ideia está
traduzida no disposto no nº3 do artigo 14 CPA.
Na perspetiva do professor Otero (2013), a “ética
digital” introduz três desafios nucleares no Direito Administrativo, que
consistem: no problema da responsabilidade, solucionar como é praticado o
controlo que incide sobre as decisões administrativas automatizadas,
principalmente, tendo em vista as consequências que poderão produzir nos seus
destinatários; a questão da padronização ética dos sistemas de IA, que abrange
a análise do conteúdo ético dos meios de obtenção do conhecimento mediante
sistemas de IA e, por último, a conexão entre robots e humanos, sendo a grande
transformação a alteração dos humanos pelos robots nas suas funções, daí se
questionar qual a legitimidade de um sistema de IA poder substituir-se a uma
decisão humana da Administração.
Transparência na atividade administrativa, as
"black boxes" e as "sanbboxes" regulatórias:
O
exercício da função administrativa detém um requisito basilar: a administração
é uma "casa de vidro", sendo que esta expressão é da autoria de
Filippo Turati que, em 17 de junho de 1908, no Parlamento italiano admitiu que:
"se e não prevalecer um interesse público que imponha um segredo
momentâneo, a casa da administração deve ser de vidro", sendo a
transparência considerada um valor fundamental, e que o Direito Administrativo
exigirá sempre ao seu respetivo agir. O distúrbio na conexão entre o Direito
Administrativo e a IA tem-se verificado no âmbito de falta de transparência que
pode advir das denominadas "black boxes".
Uma das consequências mais notórias do princípio
da transparência aplicado à tecnologia seria, desde logo, verificar que os
algoritmos teriam, obrigatoriamente que se refletir em "white boxes",
e por isso, a Administração passaria a uma espécie de "casa de vidro"
tecnológica e de acesso ou de conhecimento generalizado pelo cidadão.
Todavia,
a complexificação dos sistemas de IA atingiu níveis de tal modo significativo
que, até mesmo para a intervenção humana que os cria ou regula, fica cada vez
mais difícil justificar e analisar, como se alcançam determinadas decisões no
âmbito de processamento de dados por sistemas inteligentes, o que permite
designar aos sistemas de IA como "caixas negras".
Não obstante, os perigos mencionados e as
putativas perturbações éticas, têm-se incentivado a criação de
"sandboxes" regulatórias, as quais tem como propósito, permitir a
existência de um espaço legal e físico de experimentação tecnológica e a sua
atividade encontra-se sob alçada do Estado. Não se pense, a este respeito, que
se trata de um fenómeno inexistente. É, neste panorama, que se estabelece a
recente entrada em vigor do DL Nº67/ 2021 de julho, o qual delineou as regras basilares
para a criação de zonas livres tecnológicas.
Vinculação da informatização administrativa: os
limites da Administração eletrónica
O artigo
35, nº1 CRP assume bastante relevância no ordenamento jurídico, em relação à
temática dos limites da utilização informática.
De acordo, com o professor Gomes Canotilho (1993),
o disposto em vários números desse artigo, garante um leque de direitos
fundamentais. Começa logo no nº1, em que existe um direito de acesso das
pessoas aos registos informáticos, para conhecimento dos respetivos dados
pessoais. No nº2, existe um direito de proteção, que recai sobre os
responsáveis de ficheiros automatizados, e também a terceiros dos dados
pessoais. No nº3, há um restringimento da informática em tratar certos dados
pessoais, que estão elencados no próprio artigo. Por último, no nº5 há uma
proibição de atribuição de um número de balcão único, que é determinante para a
garantia dos direitos anteriormente mencionados.
Cabe
agora aprofundar o direito presente no nº1, que é considerada o direito básico
nesta matéria. Este direito tende a multiplicar-se em vários direitos.
Começando pelo direito de acesso, que consiste, justamente, em conhecer os
dados que estão nos registos informáticos, independentemente de serem privados
ou públicos. Depois, segue-se o direito ao conhecimento da identidade dos
responsáveis, como também o direito ao esclarecimento sobre o propósito dos
dados, o direito de contestação, que se baseia, no fundo, no direito à
retificação dos dados sobre a identidade e endereço do responsável, o direito
de atualização, sendo que é a alteração do conteúdo dos dados, na eventualidade
de ficarem desatualizados, e, por fim, o direito à eliminação dos dados, em que
o seu respetivo registo é proibido.
A articulação destes direitos e a sua
correspondente efetivação, implica que a informatização de direitos pessoais
siga certos princípios, que a doutrina tem referido. O princípio da
publicidade, traduz-se no conhecimento da criação e manutenção de registos, a
justificação social consiste, precisamente, na condução de um objetivo geral e
usos socialmente aprovados por parte das bases de dados, e limitação da
recolha, sendo realizada pelo respeito pela lei, e logicamente, terá de ter o
conhecimento da pessoa em questão, limitando-se aos dados essenciais para a
prossecução das finalidades em causa, naturalmente, que este princípio se
articula com os princípios da necessidade, proporcionalidade e adequação. No
princípio da finalidade, os dados devem se reger pelo rigor e atualidade, deve
ocorrer uma limitação da utilização, ou seja, concentrar unicamente na sua
finalidade, e garantir que haja segurança, protegendo os dados de eventuais
perdas, destruição ou acesso de terceiros. Naturalmente, que a responsabilidade
que recai sobre os responsáveis dos ficheiros, em que é exigido deveres legais
e deontológicos. Os últimos dois princípios, o da política de abertura e
limitação no tempo, correspondem, respetivamente, à garantia disponibilizada
pelos ficheiros e bancos de dados da transparência da atividade administrativa,
e o cancelamento dos dados, assim que se conclui as suas finalidades.
O nº2 também assume uma particular
relevância, dado que atribui à lei a definição de dados pessoais, porém, há que
ressalvar que a liberdade de conformação legislativa neste domínio é,
logicamente, limitada. Não existe qualquer liberdade de qualificação quanto aos
dados especificamente mencionados no número seguinte, ou seja, o nº3,
insuscetíveis de serem alvo de registo informático, e não se suscitam quaisquer
dúvidas, em relação a dados ligados à esfera dos direitos pessoais. Apenas,
existirá liberdade de atuação do legislador, em aspetos como a situação quer
económica, quer profissional.
A meu
ver, o nº3 do artigo 35 CRP, suscitou um particular, uma vez que considera de
dados bastante ligadas às convicções mais profundas das pessoas. Porém, existe
uma exceção no final do disposto no artigo, relativo ao “processamento de dados
estatísticos não individualmente identificáveis”, é nítido que, ao não serem
considerados individualmente identificáveis, deixarão de ser, no fundo, dados
pessoais.
De facto, coloca-se um conjunto de problemas, se
a questão de saber se com o consentimento do cidadão ocorrerá ou não a
possibilidade, de organizar bancos de dados com «dados pessoais», sendo que a
autorização pessoal coloca de parte, a ilicitude da conduta do responsável do
ficheiro. Contudo, é legítimo interrogar se não se está perante uma situação de
renúncia a um direito fundamental, visto que, por vezes, o cidadão na possuiu
alternativa (Lei nº10/91, artigo 32).
Gostaria, de mencionar que o nº5 proíbe
veementemente a atribuição de um número nacional de aos cidadãos, segundos os
seus termos: «É proibida a atribuição de um número nacional único aos
cidadãos.». Esta proibição foi introduzida pela Lei nº2/73, de 10-2,
regulamentada pelo Decreto-Lei nº555/73, de 26-10, cuja execução da lei, foi,
todavia, suspensa depois do 25 de Abril, devendo-se entender como revogada,
nesta parte, pelo menos, pela CRP. Ou seja, este número já possui um
antepassado histórico elevado, dado que é anterior ao 25 de Abril, aí a
informatização, efetivamente, ainda não se fazia notar.
Na ótica do professor Otero (2013), existe uma
complementaridade, tendo em consciência não só as vinculações emergentes da CRP,
mas também a unidade do sistema jurídico-administrativo na utilização da
informática numa Administração progressivamente eletrónica, envolvendo uma
certa tensão e conflitos, em relação a posições jurídicas subjetivas dos
cidadãos. Não se pode deixar de respeitar os seguintes pressupostos, baseados
em princípios: princípio da subordinação às normas constitucionais referentes à
organização, atividade e garantias administrativas, a administração eletrónica
não deixa de ser Administração pública, e por via dessa circunstância, de se encontrar
vinculada á CRP; princípio da paridade garantística entre as formas de
exercício tradicional da atividade administrativa e as novas formas eletrónicas
de agir administrativo, a transformação para uma administração eletrónica,
nunca deverá envolver um “esfumar” do nível de direitos e garantias
procedimentais e contenciosas dos cidadãos. Sem prejuízo de poderem assumir uma
configuração diferente; princípio da reserva de lei face a todas as exigências
de utilização de meios informáticos ou eletrónicos por parte dos cidadãos no
seu relacionamento com a Administração Pública, só os atos legislativos podem
criar um tal tipo de novas obrigações aos cidadãos como administrados.
Haverá um direito fundamental ao relacionamento
por meios eletrónicos com a Administração Pública?
Apesar do
disposto no artigo 35, nº1 CRP ser perentório, é legítimo questionar se a
progressiva informatização da Administração Pública permite vislumbrar a
formação e o desenvolvimento de novos direitos dos cidadãos perante a Administração, poder-se-á equacionar se, em
vez de um princípio de acessibilidade à informação e aos serviços
administrativos por via eletrónica, não terá ocorrido, entretanto, por via
consuetudinária, uma subjetivação desta norma, registando-se a existência de um
direito de cada cidadão a relacionar-se por meios eletrónicos com a
Administração Pública.
O
professor Otero (2013), levanta a dúvida se o desenvolvimento da Administração
Pública, através dos meios eletrónicos, coloca o surgimento e, naturalmente, o
desenvolvimento de novos direitos dos cidadãos perante a Administração. No
seguimento desse raciocínio, não se terá formado um costume, pela subjetivação
dessa norma, ocorrendo a existência de um direito de cada cidadão, a
relacionar-se por meios eletrónicos com a Administração Pública.
De acordo, com o disposto no artigo 35, nº6 CRP
"a todos é garantido livre acesso às redes informáticas de uso
público". É possível afirmar que corresponde a um direito inserido no
espaço da liberdade de expressão, não de uma forma convencional, mas sim
através da Internet. Não sendo aqui em causa, diretamente, a afirmação de uma
posição jusfundamental dos cidadãos, enquanto administrados, face à
Administração.
A
existência de um direito de cada cidadão a relacionar-se por meios eletrónicos
com a Administração Pública, embora preveja abranger as posições jurídicas
ativas previstas no artigo 35, nº1,2 e 4 CRP, terá um espetro bem mais
alargado, que naturalmente compreendida todas as formas possíveis de
relacionamento dos cidadãos com a Administração Pública. Tratar-se-á em
qualquer caso, de um direito sempre dependente do financeira e tecnicamente
possível face a cada estrutura administrativa, sendo possível que, numa
situação multifacetada e plural de Administração Públicas, existam,
naturalmente, níveis diferenciados de satisfação de um tal direito subjetivo ao
relacionamento por meios eletrónicos com a Administração Pública.
Há que
levantar uma questão bastante inquietante, se esse direito de cada um se
relacionar com a Administração Pública utilizando meios eletrónicos será,
efetivamente, um verdadeiro direito fundamental e, em caso afirmativo,
colocar-se-á duas hipóteses credíveis, ou se se integra na ordem jurídica por
via da cláusula aberta do artigo 16n º1 CRP, ou em alternativa, se se trata de
um direito implícito no artigo 35 CRP.
Bibliografia:
- Silva,
Artur Flamínio da Inteligência artificial e direito administrativo, Coimbra:
Almedina, 2 Ed., 2021, ISBN: 9789724099668, pp. 14
- Otero Paulo, Manual de Direito Administrativo, edições
Almedina S.A, 2013, pp. 484-498
- Canotilho, J.J Gomes e Moreira, Vital, Constituição
da República Portuguesa/ anotada, artigo 35º, 3 edição, Coimbra Editora, 1993,
pp. 215-219
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