Maria Ana Gaspar, n.º
66164, subturma 15, Turma B
O PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE
NA DECISÃO
ADMINISTRATIVA
Introdução
A Administração deve tentar alcançar o ideal da equidade do caso concreto,
agindo de forma a que cada cidadão receba o que lhe é devido, fazendo-se assim
a chamada justiça. Para tal, importam vários princípios estruturantes, como
o princípio da legalidade, da boa
administração, da igualdade, da boa-fé, da proporcionalidade, da
imparcialidade, entre outros.
Proponho-me aqui desenvolver em especial o princípio da proporcionalidade,
desde logo porque este representa em si mesmo uma manifestação da justiça,
sendo considerado pela doutrina como tendo natureza compósita, mesmo como
o princípio de princípios.
Como na sua atuação, e até onde isso seja compatível com a prossecução do
interesse público, a Administração deve procurar provocar a menor lesão
possível aos interesses dos administrados, conforme previsto no artigo 7.º do
Código de Procedimento Administrativo (CPA), importa também analisar as
decisões dos tribunais administrativos superiores para um melhor entendimento
do princípio da proporcionalidade.
I. Princípios/limites à
atuação da Administração Pública
A atuação da Administração Pública, ainda
que discricionária, está vinculada ao cumprimento dos princípios estruturais de
Direito. Sendo que, relativamente ao direito administrativo, muitos dos
princípios fundamentais encontram-se consagrados na Constituição da República
Portuguesa (CRP).
Como parâmetros decisórios que são, os
princípios não podem ser ignorados, devendo, assim, a Administração Pública
sujeitar-se aos princípios gerais de direito de carácter formal ou
procedimental (como, por exemplo, o princípio da audiência prévia ou da
eficiência), e a outros de natureza material (como, por exemplo, os princípios
da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé).
Os princípios são uma forma de controle do
poder discricionário, daí a sua importância. Sendo que, de acordo com a
definição do Professor Marcelo Rebelo de Sousa1, a
discricionariedade “consiste numa liberdade conferida por lei à
administração para que esta escolha entre várias alternativas de actuação
juridicamente admissíveis.”
Carla Amado Gomes2 refere
mesmo que “(…) o respeito pelos princípios da legalidade, igualdade,
imparcialidade e proporcionalidade é indutor de ‘boas’ decisões, ou seja, de
boa administração.” Pelo que as decisões dos tribunais não devem
infringir os princípios que limitam ou
condicionam a discricionariedade administrativa, nomeadamente os princípios
elencados no n.º 2 do artigo 266.º da CRP e no artigo 3.º e seguintes do CPA.
Considerando que a justiça da decisão
joga-se na concretização de todos estes princípios, a autora destaca o
princípio da proporcionalidade, porquanto este “(…) se revela
especialmente útil na caracterização da aptidão da decisão para preencher os
objectivos, de interesse público e particular, a que se destina.”
II. A Utilidade do Princípio
da Proporcionalidade
“O princípio da proporcionalidade
constitui uma manifestação constitutiva do princípio do Estado de Direito
(artigo 2.º da CRP). Na verdade, está fortemente ancorada a ideia de que, num
Estado de Direito democrático, as medidas dos poderes públicos não devem
exceder o estritamente necessário para a realização do interesse público.”, afirma o Professor
Freitas do Amaral3, citando Gomes Canotilho e Vitalino Canas.
Já os Professores Marcelo Rebelo de Sousa
e André Salgado de Matos4 consideram que “Pela
sua densificação doutrinal e jurisprudencial, o princípio da proporcionalidade
(art. 266.º, 2 CRP e art. 5.º, 2 CPA [atual artigo 7.º], com
diversas concretizações específicas: arts. 18.º, 2 e 19.º, 4 CRP; art. 3.º, 2
CPA) constitui, porventura, o mais apurado parâmetro de controlo da actuação
administrativa ao abrigo da margem de livre decisão.”
O CPA, sob a epigrafe “Princípio
da proporcionalidade”, dispõe no seu artigo 7.º, n.º 1, que “Na
prossecução do interesse público, a Administração Pública deve adotar os
comportamentos adequados aos fins prosseguidos.” e, no n.º 2,
que “As decisões da Administração que colidam com direitos subjetivos
ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afetar essas
posições na medida do necessário e em termos proporcionais aos objetivos a
realizar”.
Com a alteração do CPA pelo Decreto-lei
n.º 4/2015, de 7 de janeiro, que não era objeto de revisão desde 1996, o atual
artigo 7.º do CPA, dedicado exclusivamente ao princípio da
proporcionalidade, “(…) passa a acolher as três dimensões do princípio
da proporcionalidade, isto é, a adequação, a necessidade e a proporcionalidade
em sentido estrito.”, diferentemente do anterior artigo 5.º, que dava
conta apenas de duas dimensões, como refere Sandra Lopes Luís5.
Anteriormente à entrada em vigor do
Decreto-lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, o então artigo 5.º, relativo aos
princípios da igualdade e da proporcionalidade, dispunha no seu n.º 2 que “as
decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses
legalmente protegidos dos particulares só podem afectar as posições em termos
adequados e proporcionais aos objectivos a analisar”, referindo apenas duas
das dimensões do princípio da proporcionalidade.
É o próprio legislador, que, quando no
preâmbulo do Decreto-lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, salienta que “No
capitulo II da parte I do novo Código, dedicada aos «princípios gerais da
atividade administrativa», registam-se inovações significativas relativamente
ao disposto nesta matéria no anterior Código.”, destaca as alterações ao
princípio da proporcionalidade, e faz especial menção à expressa inclusão da
proibição do excesso no princípio da proporcionalidade.
III. O princípio da
proporcionalidade nas suas três dimensões
Consagrado no artigo 7.º do CPA e no
artigo 266.º, n.º 2, da CRP, a proporcionalidade é definida por Freitas do
Amaral6 como “o princípio segundo o qual a
limitação de bens ou interesses privados por atos dos poderes públicos deve ser
adequada e necessária aos fins concretos que estes atos prosseguem, bem como
tolerável quando confrontada com aqueles fins”.
Impõe-se distinguir a ideia de
proporcionalidade da ideia de igualdade. Como sintetiza o Professor Vitalino
Canas, citado por Freitas do Amaral7, o princípio da
igualdade baseia-se na apreciação de dois tipos legais na sua relação, na sua
comparação, já o princípio da proporcionalidade preocupa-se com a verificação
de saber se o sacrifício de certos bens ou interesses é adequado, necessário,
tolerável, na relação com os bens e interesses que se pretende promover.
Aquando da análise de uma decisão administrativa importa perceber se houve
violação do princípio da proporcionalidade, analisando o fim pretendido e a
medida adotada. Para tal, há que ter em conta as três dimensões deste
princípio: adequação; necessidade e equilíbrio. Quanto à primeira, significa
que a solução adotada deve ser a idónea ou apropriada à finalidade de interesse
público tida em vista. Já a necessidade corresponde à proibição do excesso e o
equilíbrio significa que deve haver uma ponderação sobre os benefícios ou
vantagens para o interesse público e os custos ou prejuízos impostos pela
medida a adotar.
Para analisar a verificação do princípio
da proporcionalidade, devemos, então, proceder à aplicação sequencial de três
testes, que é, no fundo, uma demonstração da verificação do princípio em causa,
nas suas três vertentes.
Como referem Marcelo Rebelo de Sousa e
André Salgado de Matos8, “A preterição de qualquer
uma das três dimensões envolve a preterição global da proporcionalidade ( … )
Perante a preterição de uma delas, não vale sequer a pena analisar as demais”.
Isto é, cada um destes testes é determinante para que possamos continuar esta
análise, ou seja, não havendo nada que verificar, por exemplo, no segundo
parâmetro se o primeiro não se encontrar satisfeito, e o mesmo com o segundo e
o terceiro.
A primeira dimensão do princípio da
proporcionalidade consiste em saber se a medida em causa é idónea, se é apta.
Este teste é muitas vezes referido pela doutrina como o teste da adequação, uma
vez que procura precisamente perceber se a medida é adequada, se é suscetível
de alcançar o fim visado, se permite que este seja alcançado, sendo, nesse
caso, adequada.
De seguida, passando para o segundo teste
- referido pela doutrina como da necessidade ou ainda da proibição do excesso -
em que a escolha da medida necessária não terá apenas em conta os particulares,
mas também a Administração pública, optando pela medida que menos lese tanto os
particulares como os restantes fins de interesse público envolvidos e cuja
prossecução possa afetar, está em causa ponderar se justificará de alguma
forma os possíveis sacrifícios de interesses particulares que surjam em
conflito com o interesse público.
Quanto à última vertente da
proporcionalidade, são quatro as expressões utilizadas para lhe fazer
referência, proporcionalidade em sentido estrito, justa medida, equilíbrio ou
ponderação. Este último teste consiste, uma vez ultrapassados os outros dois,
em verificar os custos e benefícios da adoção da medida em causa. Significa
aplicar o princípio da ponderação, sendo que o seu grau de exigibilidade varia
consoante o procedimento administrativo em causa.
Assim, se uma medida concreta não for
simultaneamente adequada, necessária e equilibrada ao fim tido em vista, ela
desrespeita o princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 7.º do CPA e
no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.
IV. Tribunais e
Administração: os limites do princípio da proporcionalidade
Sendo o princípio da proporcionalidade
considerado como um parâmetro de controlo da atuação administrativa ao abrigo
da margem de livre decisão, é fundamental analisar as decisões dos tribunais
sobre esta matéria.
O Tribunal Central Administrativo Norte
(TCA Norte), em Acórdão9 de 11/11/2022, invocando as
três vertentes da proporcionalidade supra referidas, considerou que “O
princípio da proporcionalidade significa que, até onde seja compatível com a
prossecução do interesse público, a Administração deve procurar, na sua
atuação, ser o menos hostil possível aos interesses dos administrados (art. 7.º
do CPA). Para isso terá que usar como critérios de decisão a adequação (a
solução adotada deve ser a idónea ou apropriada à finalidade de interesse
público tida em vista), a necessidade (proibição do excesso) e o equilíbrio
(deve haver uma ponderação sobre os benefícios ou vantagens para o interesse
público e os custos ou prejuízos impostos pela medida a adotar).”
Neste processo, a Autora peticionou a
declaração de nulidade ou a anulação do ato administrativo do Ministério
do Planeamento e das Infraestruturas, que, além do mais, ordenou a demolição de
construções ilegais em espaço vinculado pela Reserva Ecológica Nacional (REN) e
reconstituição da situação anterior, porquanto entendeu que o ato impugnado
padecia de vários vícios, nomeadamente de violação do princípio da
proporcionalidade e do princípio da proteção da confiança.
Por sua vez, o Ministério/Réu contestou,
alegando, em síntese, que a pretensão da Autora de legalização das obras
efetuadas para ampliação de um estabelecimento de restauração e bebidas foi
indeferida e emitida ordem de demolição das construções ilegais e consideradas
insuscetíveis de legalização, não ocorrendo qualquer violação do princípio da
proporcionalidade, na medida em que apenas podem ser legalizadas as construções
que sejam conformes com a REN. Considerando que “Está em causa um
grave dano ao ambiente, não restando alternativa à demolição ordenada.”, o
Réu concluiu, pedindo a improcedência da ação, no que foi acompanhada por
parecer do Ministério Público.
A Autora, inconformada com a decisão de
primeira instância, que julgou a ação improcedente, recorreu para o TCA Norte,
que, entre outros, e no que importa para o objeto do trabalho a que
me proponho, analisou a questão de saber “(…) se a sentença recorrida
padece de erro de direito decorrente de se ter considerado que o ato impugnado
não violou o princípio da proporcionalidade (…).”
Em sede de recurso, a Autora defendeu que
na Sentença foi violado o princípio da proporcionalidade, previsto nos artigos
7.º do CPA e 18.º, n.º 2, da CRP, com o fundamento, cfr. ponto 8.1 do
Acórdão, de que o empreendimento em questão foi autorizado pela
Câmara Municipal, “(…) a qual em 1995 até declarou o empreendimento de
utilidade pública com interesse local e regional, pelo que, dúvidas não podem
restar que o ato administrativo impugnado traduzido na ordem de demolição, e a
sentença recorrida que o confirma, são desadequados, excessivos,
desproporcionais e contrários ao princípio da proporcionalidade e ao princípio
da proteção da confiança. Ademais a demolição ordenada põe em causa a
subsistência da Apelante e dos postos de trabalho que esta cria, na medida em
que essa demolição acarreta o encerramento da empresa.”
No Acórdão em análise, embora o TCA Norte
reitere que a proporcionalidade, consagrada no artigo 7.º do CPA significa que
a Administração deve procurar, na sua atuação, ser o menos hostil possível aos
interesses dos administrados até onde seja compatível com a prossecução do
interesse público, salienta, no entanto, que, apesar da proporcionalidade ser
um critério limitativo do exercício da discricionariedade administrativa e da
liberdade de decisão que lhe está associada, não as pode eliminar na sua
totalidade.
Fazendo referência a Luiz Cabral de
Moncada10, o TCA Norte refere que, apesar do princípio da
proporcionalidade limitar a oportunidade ou mérito das escolhas
administrativas, certo é que não possibilita um controlo judicial integral da
liberdade administrativa. Concluindo com as palavras do mesmo autor, o TCA
Norte salienta que a proporcionalidade é “a par dos outros princípios
gerais de direito, um critério legal de controlo da discricionariedade mas não
a reduz a zero. A proporcionalidade não é o salvo-conduto para a abolição das
fronteiras entre Tribunais e a Administração”.
Estabelecendo limites ao princípio da
proporcionalidade, o Acórdão do TCA Norte como que adverte “(…) que só
em casos irrefutáveis, pelo seu carácter manifestamente inadequado, o princípio
da proporcionalidade deva ser feito valer contra o poder discricionário que
possa assistir à Administração.”, decidindo, assim, na situação concreta em
apreciação que o ato impugnado não viola qualquer princípio regulador da
atuação administrativa.
Referindo que sendo a ordem de demolição a
consequência imposta pelo cumprimento do princípio da legalidade urbanística,
na medida em que as obras realizadas pela Autora não são suscetíveis de ser
legalizadas, por não se conformarem com o regime jurídico da REN, não restava
outra alternativa ao Réu/Ministério senão fazer cumprir a legalidade
urbanística.
Assim, na fundamentação do seu Acórdão, o
tribunal superior considera que, conforme resulta dos factos provados, o
Réu “(…) não determinou a demolição das obras sem antes esgotar todas
as possibilidades em ordem à respetiva legalização”, pelo que concluiu
que “uma atuação legal é vinculativa, não depende da boa ou má vontade
da Administração Pública, nem deixa espaço à Administração para conformar o seu
agir de modo a contornar as consequências mais dolorosas ou hostis da reposição
da legalidade que daí eventualmente possam resultar para o interessado que
ousou arriscar a construção de uma obra sem se sujeitar ao prévio e obrigatório
controlo urbanístico.”
Concluindo, a obediência à
proporcionalidade não significa que a Administração não possa agir livremente,
pois, se a sua atuação obedecer aos parâmetros previstos legalmente, só em
situações manifestamente inadequadas este princípio prevalece sobre o poder
da Administração.
Perante decisões administrativas que
contrariem princípios, o CPA consagra, no seu artigo 163.º, como regime
aplicável o da anulabilidade.
Por sua vez, o Tribunal
Central Administrativo Sul (TCA Sul), em Acórdão11 datado
de 02/07/2020, citando o Supremo Tribunal de Justiça (Acórdão de 05/06/2012,
Proc. 127/11.3YFLB), nota que “(…) a exigência jurídica de
"proporção" das decisões da Administração aos objectivos a realizar
não constitui um atentado ao nosso sistema de separação entre a Administração
Pública (o Poder Executivo) e os Tribunais, que exclui da jurisdição destes o
controlo da oportunidade e mérito da actividade daquela.”
Considerando, no mesmo
sentido do Acórdão do TCA Norte anteriormente analisado, que “A
proposição pacífica da invalidade jurídica do acto desproporcionado (ou
inadequado) tem, pois, de ser entendida cuidadosamente: é fácil asseverar que
não se pode, para esses efeitos, confundir a proporcionalidade (jurídica) com o
mérito (administrativo) de uma decisão, mas é muito difícil determinar através
de cláusulas gerais onde acaba uma e começa o outro - salvo tratando-se de um
caso de inadequação objectiva da medida tomada à finalidade proposta.”
No Acórdão11,
datado de 02/07/2020, esteve em apreciação pelo TCA Sul a Sentença
que julgou procedente a ação deduzida contra o Instituto Público de
Financiamento da Agricultura e Pescas (IFAPJ.P.),
concluindo pela verificação da violação do princípio da proporcionalidade e,
com esse fundamento anulou o ato impugnado que ordenou a devolução do “subsídio
à electricidade verde”, no montante de €14.368,81.
O IFAPJ.P. recorreu da decisão que,
confirmando a sentença reclamada, julgou procedente a ação administrativa,
anulando o ato impugnado, que ordenou à Autora a reposição do montante global
de € 14.368,81, por violação do princípio da proporcionalidade, nas suas três
vertentes. Discordando o Recorrente do fundamento, segundo o qual muito do
consumo elétrico em causa estava subordinado à atividade agrícola subsidiada,
defendeu antes que a Autora utilizou o
subsídio em atividades não elegíveis, designadamente consumo doméstico e
industrial, logo, para fins não permitidos, tornando impossível
determinar qual o montante elegível em termos de ajuda à eletricidade verde.
Defendendo que o ónus de comprovação da energia efetivamente consumida em
atividades elegíveis recairia sempre sobre o beneficiário da ajuda, este
Instituto Público considerou que a Autora estaria obrigada a devolver os
montantes que lhe foram concedidos.
Quanto aos factos, o TCA Sul notou que não
foi feita pela Autora a separação dos consumos energéticos da atividade
subsidiada dos outros consumos, por inexistirem contadores separados, o que
impossibilitou aferir qual a energia elétrica consumida a coberto da atividade
subsidiada, apesar de ser certo que a maioria do consumo de eletricidade foi
para a atividade subsidiada. O IFAPJ.P. determinou a reposição da
totalidade do subsídio pago, sendo que o tribunal a quo acionou
o princípio da proporcionalidade tendo em vista aferir da exigibilidade e
adequação da medida administrativa face aos objetivos a realizar.
O TCA Sul decidiu que o juízo formulado
pelo tribunal a quo relativamente à violação do princípio da
proporcionalidade, determinativa da invalidade do ato impugnado, não merecia
censura, pois, conforme dispõe o artigo 7.º do CPA, a decisão da Administração que colida com
direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só
pode afetar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objetivos a
realizar.
Considerando o TCA Sul que “os
fins visados pela concessão e pagamento do subsídio foram prosseguidos pela
ora Recorrida, pois demonstrou-se que o consumo elétrico
em apreço estava efetiva e reconhecidamente subordinado e associado à atividade
subsidiada, e que a percentagem dos consumos irregulares, no quadro geral dos
consumos de eletricidade verificados com a exploração em causa, ao longo de
cerca de 6 anos, assumia um peso relativo despiciendo”, decidiu que o
ato impugnado, que exigiu a devolução integral do subsídio pago, é violador do
princípio da proporcionalidade.
Isto porque considerou que os factos
descritos neste caso concreto consubstanciam uma compressão da esfera
patrimonial da Autora, injustificada face à irregularidade que foi cometida,
dispensando como tal a sanção aplicável.
Por fim, considerou o TCA Sul que o
Instituto Público em causa “(…) não observou este princípio vinculante
da atividade administrativa – e podia tê-lo feito, ajuizando devidamente a
pronúncia do interessado na audiência prévia realizada – com o que se opera um
efeito invalidante do ato impugnado, por violação de lei.”
Conclusão
O princípio da proporcionalidade
consubstancia um critério limitativo do exercício da discricionariedade administrativa
e da liberdade de decisão que lhe está associada, isto é, baliza as escolhas
administrativas. No entanto, não possibilita um controlo judicial integral da
liberdade administrativa.
Pelo que se conclui,
citando Cabral da Moncada10 quando diz que o princípio
da proporcionalidade é “a par dos outros princípios gerais de direito,
um critério legal de controlo da discricionariedade mas não a reduz a zero. A
proporcionalidade não é o salvo-conduto para a abolição das fronteiras entre
Tribunais e a Administração”.
(1) in Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito
Administrativo Geral, Introdução e Princípios Fundamentais, Tomo I, 2ª Ed.
(2006), Dom Quixote, pág. 184;
(2) in www.cej.justiça.gov.pt: Responsabilidade civil
extracontratual do Estado e demais entidades públicas – maio 2020, Págs. 56 e
57;
(3) in Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol.
II, Pág. 127, Almedina, 2001.
(4) in Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito
Administrativo Geral, Introdução e Princípios Fundamentais, Tomo I, 2ª Ed.
(2006), Dom Quixote, pág. 211;
(5) in www.estudogeral.uc.pt/Princípio
Proporcionalidadde_ebook, pág. 63 e 64/2021, XIII Encontro de
Professores de Direito Público, que teve lugar na Faculdade de Direito de
Coimbra.
(6 e 7) in Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo,
Vol. II, Almedina, 2001, Págs. 129 e 132.
(8) in Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito
Administrativo Geral, Introdução e Princípios Fundamentais, Tomo I, 2ª Ed.
(2006), Dom Quixote, pág. 212.
(9) in www.dgsi.pt: Acórdão do TCA Norte,
Proc. nº 01158/17.5BEAVR, 1.ª secção, de 11/11/2022, Relatora Helena Ribeiro.
(10) in Luiz Cabral de Moncada, Código do Procedimento
Administrativo Anotado, 2ª ed., p. 96.
(11) in www.dgsi. pt: Acórdão
do TCA Sul, Proc. 1471/09.5BELRA, de 02/07/2020, Relator Pedro Marchão Marques.
Bibliografia
- MARCELO REBELO DE SOUSA E ANDRÉ SALGADO DE MATOS, “Direito
Administrativo Geral”, Tomo I, 2ª Ed., Dom Quixote;
- DIOGO FREITAS DO AMARAL, “Curso de Direito
Administrativo”, Vol. II, 2008, Almedina;
- LUIZ CABRAL DE MONCADA, Código do Procedimento
Administrativo Anotado, 2ª Ed.;
- www.dgsi.pt;
- www.cej.justiça.gov.pt: Responsabilidade civil
extracontratual do Estado e demais entidades públicas – maio 2020;
- www.estudogeral.uc.pt/Princípio
Proporcionalidadde_ebook, 2021, XIII Encontro de Professores de
Direito Público.
Maria Ana Gaspar, n.º
66164, subturma 15, Turma B
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