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segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Princípios Constitucionais da atividade Administrativa

 Princípios Constitucionais da atividade Administrativa

 

1.   Apresentação do Tema

 

Há uma relação de grande proximidade e relevância entre a Constituição da República Portuguesa e os vários ramos de direito português, sendo que um deles é o direito Administrativo. Um dos aspetos que confirma a afirmação anterior será analisado ao longo deste trabalho, e diz respeito aos princípios gerais da atividade administrativa enumerados pelo artigo 266.º, da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), que têm como objetivo, segundo as palavras do professor Paulo Otero, “reger o modo como a Administração  Pública, exercendo a sua atividade (jurídica ou não jurídica), desenvolve a sua função administrativa”.

Os princípios que estão constitucionalmente expressos no artigo mencionado anteriormente, são: 

·       legalidade;

·      Prossecução do interesse público;

·      Respeito pelos direitos dos particulares;

·       Proporcionalidade;

·      Imparcialidade;

·      Boa-fé;

·      Igualdade;

·      Justiça.

 

Em seguida, iremos analisar individualmente cada um dos princípios anteriores com o objetivo de entender melhor o conceito e conteúdo dos mesmos.

 

2 . Princípios Gerais da atividade administrativa

 

2.1 – Princípio da Legalidade

 

princípio da legalidade, ou da juridicidade, ideia que pretende identificar que a Administração Pública, para além de estar sujeita á Constituição e á lei, está também subordinada “ao Direito e a todo o Direito”, expressão utilizada pelo professor Paulo Otero, ou seja, qualquer tipo de fonte, seja ela nacional ou internacional, o que significa que toda a atuação administrativa está limitada ou condicionada por qualquer tipo de ordem jurídica. É um princípio que sofreu várias mudanças ao longo do tempo, e diz-nos que a Administração Pública só pode agir segundo a permissão das normas, o que significa que só e lícito aquilo que é permitido pelas normas, tal como o professor Freitas de Amaral afirma quando menciona que “a Administração Pública tem de prosseguir o interesse público em obediência á lei”, segundo o mesmo, este é “sem dúvida um dos mais importantes princípios gerais de direito aplicáveis á Administração Pública”. 

 

Outra visão que define este princípio é a do professor Marcello Caetano, que afirma que “nenhum órgão ou agente da Administração Pública tem faculdade de praticar atos que possam contender interesses alheios senão em virtude de uma norma geral anterior”, ou seja, a Administração Pública não pode lesar os direitos dos particulares.

 

Atualmente, este (princípio) encontra-se ao abrigo do artigo 266.º, n.º2 da CRP, onde podemos observar a seguinte afirmação “os órgãos e os agentes administrativos estão subordinados á Constituição e á lei (…)”, para além deste, o artigo 3.º n.º1, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), menciona também que “os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência á lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes foram conferidos e em conformidade com os respetivos fins”. 

 

2.2 – Princípio da prossecução do interesse público 

 

princípio da prossecução do interesse público, encontra-se ao abrigo do art. 266.º, n.º1 da CRP em primeiro lugar, que segundo o professor Vasco Pereira da Silva serve como “modo de acentuar a subordinação da administração ao bem comum”, para além da Constituição da República Portuguesa, também o Código do Procedimento Administrativo (CPA) menciona o princípio no art.4º.

 

Para o professor Vasco Pereira da Silva, este princípio origina duas consequências, sendo a primeira o facto da administração só poder prosseguir o interesse publico, uma vez que é proibido prosseguir, ainda que de forma acessória, interesses privados, e a segunda é a administração só poder prosseguir interesses públicos definidos pela Constituição ou por lei, para cada atuação normativamente habilitada, visto que se o interesse for considerado privado ou público alheios ao fim normativamente fixado, então é ilegal e inválido.

 

A opinião do professor Paulo Otero acaba por ir na mesma direção, uma vez que para professor a “Administração Pública nunca pode deixar de estar ao serviço dos interesses gerais da coletividade”, ou seja , não pode prosseguir a satisfação de interesses alheios ou de um grupo particular de pessoas, visto que a “Administração Pública visa a defesa, garantia e a promoção do bem comum ou interesse público”. Uma afirmação do professor Paulo Otero que minha opinião é extremamente relevante e essencial quanto á importância deste princípio é a de “respeitada que seja a dignidade humana, o interesse público constitui o critério, o fundamento e o limite da atuação administrativa”.

Quanto a este princípio, o professor Freitas de Amaral fala também sobre as consequências já referidas pelo professor Vasco Pereira da Silva, afirmando que a noção de interesse público é muito variável e que pode mudar consoante o tempo, por isso o mesmo deve sempre ser definido por lei, de forma a saber qual o interesse que se deve prosseguir.

 

2.3 — Princípio do Respeito pelos Direitos dos Particulares 

 

Em seguida temos o Princípio do Respeito pelos Direitos dos Particulares, que se encontra consagrado no artigo 266.º, n.º1, da CRP e no artigo 4.º, do Código do Procedimento Administrativo. Este , segundo o professor Vasco Pereira da Silva, caracteriza-se por ser um meio de defesa dos particulares contra a “subalternização” do Estado, e define que o interesse público não deve ser obtido sem a consideração dos direitos dos particulares. Outro aspecto muito importante mencionado pelo professor é a “dupla natureza, subjetiva e objetiva” do Direito Administrativo, uma vez que procura seguir o interesse público e o respeito pelos direitos dos particulares.

 

O professor Paulo Otero afirma também que o princípio determina que a Administração  Pública deve procurar e prosseguir sempre a alternativa não danosa, ou se for impossível, a que menor danos provoque aos direitos dos particulares. Em caso de haver um “sacrifício individual” em benefício do interesse coletivo, há também o dever de indemnizar os danos sofridos (exemplo: patrimoniais). Os direitos de natureza pessoal, bem como a dignidade humana são difíceis de se indemnizar e por isso necessitam de um maior rigor e atenção por parte da Administração Pública.

 

Por último, o professor Freitas de Amaral, afirma que este princípio retrata a “essência do Direito Administrativo” que procura sempre satisfazer o interesse público, respeitando os direitos dos particulares, que segundo o mesmo, diz respeito aos direitos de todos os particulares, mesmo que não sejam cidadãos.

 

2.4 — Princípio da Proporcionalidade 

 

Princípio da proporcionalidade encontra-se ao abrigo do artigo 266.º, n.º2, da CRP e do artigo 7.º, do Código do Procedimento Administrativo.

 

Segundo o professor Vasco Pereira da Silva, este é o “mais apurado parâmetro de controlo de margem de livre decisão administrativa” que se baseia em três dimensões : de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido restrito.

A adequação proíbe condutas administrativas que não coincidem com o objetivo que procuram atingir, a necessidade proíbe condutas administrativas que não sejam indispensáveis para a realização do objetivo definido e por último, a proporcionalidade em sentido restrito proíbe que os custos da atividade da administração para alcançar um determinado objetivo, sejam superiores aos benefícios que se sejam de esperar da sua realização. A preterição de uma das dimensões, representa a preterição global da proporcionalidade.

 

Para além destas, o professor Paulo Otero afirma ser possível identificar uma quarta vertente da proporcionalidade, sendo ela a proteção insuficiente ou proibição do defeito, tendo por base a jurisprudência do Tribunal Constitucional no âmbito legislativo. Esta vertente ou, segundo o professor, “princípio parcial” (para o professor Vasco Pereira da Silva, dimensão) do princípio da proporcionalidade, determina que uma proteção mínima, por defeito ou défice que não correspondam ás exigências constitucionais ou legais, origina ilegalidade da decisão, havendo, “uma inadequação da medida”.

Existem vários exemplos específicos da proporcionalidade, tal como o n.º2 do artigo 18.º, da CRP, que diz respeito á restrição de direitos fundamentais ou o artigo 3.º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo em matéria de estado de necessidade.

 

2.5 — Princípio da Imparcialidade 

 

Em seguida temos o princípio da imparcialidade, que se encontra explícito no número.º 2 do artigo 266.º, da CRP e no artigo 9.º do Código do Procedimento Administrativo.

 

Para o professor Vasco Pereira da Silva, este caracteriza-se como um comando de consideração e ponderação de interesses públicos e privados em cada caso concreto. Quanto ao mesmo (princípio), é possível identificar duas dimensões, a negativa e a positiva. A dimensão negativa proíbe a Administração Pública de considerar ou ponderar interesses públicos ou privados que sejam irrelevantes para a decisão com vista ao objetivo final, por outro lado, a dimensão positiva exige que todos os interesses públicos ou privados relevantes para a decisão, sejam considerados ou ponderados sem prejudicar ou beneficiar qualquer um deles. O professor fala também no facto deste ser um princípio onde a sua violação é muito difícil de provar, e por essa razão foram criadas garantias de imparcialidade, de forma a impedir a intervenção de agentes quando não se consegue garantir a sua isenção, quando há uma grande proximidade entre o titular de órgão ou agente e o interesse privado (proibição absoluta), havendo situações onde só há proibição relativa, ou seja, é feita uma ponderação sobre o caso. A violação de um impedimento origina ilegalidade e responsabilidade disciplinar dos envolvidos.

 

O professor Paulo Otero menciona ainda o conceito de justiça, afirmando que a mesma está associada a este princípio, uma vez que o objetivo final é impedir que o interesse particular dos agentes prejudique o interesse público.

 

 

2.6 — Princípio da boa-fé 

 

princípio da boa-fé surge após a revisão de 1996 e integra neste momento o número.º2 do artigo 266.º da CRP e o artigo 10.º do Código de Procedimento Administrativo. O princípio é um meio imperativo de ponderação dos valores fundamentais do direito e pretende manter a tutela de confiança entre as partes, bem como no objetivo a alcançar com a ação realizada.

 

Um dos aspetos mais relevantes é a tutela de confiança, que tem como objetivo defender a posição dos sujeitos jurídicos contra as iniciativas injustas e injustificadas por parte de outros agentes, para além disso, serve como um parâmetro de controlo da atividade administrativa pelos tribunais, segundo o professor Vasco Pereira da Silva. Vale a pena mencionar que, segundo o Supremo Tribunal Administrativo, a quebra da tutela da confiança não significa que o ato seja sempre invalido, uma vez que em alguns casos (vinculado conforme a lei) há apenas o dever de indemnizar.

 

O professor Paulo Otero apresenta também uma definição quanto ao princípio em causa, afirmando que o mesmo “impõe que a Administração Pública não possa extrair qualquer vantagem de uma atuação falsa, inexata, ou contrária a um comportamento gerador de confiança”, e menciona que deve haver uma ética honesta e leal no agir administrativo, identificando alguns vínculos a que a administração está sujeita, como o respeito pelas promessas feitas, a proibição de abuso de direito e de comportamentos contraditórios, a relevância da culpa in contrahendo, a proibição da fraude á lei e por último, o respeito pela tutela de confiança e da segurança jurídica.

 

2.7 – Princípio da Igualdade 

 

Os artigos número 13.º e 266/2.º, da CRP e o artigo 6.º, do Código do Procedimento Administrativo, dão abrigo ao princípio da igualdade.

 

Este impõe igualdade na nossa vida, ou seja, situações iguais exigem o mesmo tratamento e resolução, enquanto que situações diferentes exigem tratamento e resolução diferentes. Para se poder afirmar que há invalidade numa conduta através do princípio da igualdade, é necessário analisar e provar que duas situações iguais tenham tido um tratamento diferente, uma da outra.

Podemos então afirmar que a igualdade impõe que todos os cidadãos sejam tratados pela lei do mesmo modo, excepto em situações de fundamento racional onde as diferenças reflitam e justifiquem um tratamento diferenciado. Esta obrigação origina por si só uma proibição de discriminação infundada ou arbitrária, exigindo assim solução idêntica aos casos idênticos, mantendo assim o respeito pelas normas e indivíduos em causa.

 

O professor Freitas de Amaral apresenta uma definição que resume muito bem este princípio, afirmando que “a igualdade impõe que se trate de modo igual o que é juridicamente igual, e de modo diferente o que é juridicamente diferente, na medida da diferença” e indica que mesmo se projeta em duas direções, a proibição de discriminação e a obrigação de diferenciação.

 

 

2.8 — O Princípio da Justiça 

 

Por fim temos o princípio da justiça, que pode ser encontrado no artigo 266/2.º, da CRP e no artigo 8.º do Código do Procedimento Administrativo.Podemos dizer que se baseia em combater e evitar situações de injustiça, devendo a cada um ter aquilo que lhe é devido, sendo que a Administração Pública deve sempre procurar agir sobre valores de equidade.

 

Um dos temas mais debatidos ao longo dos tempos é justamente o conceito de justiça (definição) e o que o mesmo engloba, uma vez que pode apresentar várias dimensões, tal como a dimensão estruturante do Estado de Direito material e a vinculação do poder á justiça, uma vez que, para Locke, a justiça é o fundamento, o critério e o limite do poder. Porém, ao analisar mais detalhadamente o conceito de justiça, conseguimos perceber que está intrinsecamente ligada á administração e a toda a sua organização, especialmente devido á dimensão procedimental do tema em questão.

A dimensão procedimental visa garantir que todos os processos e procedimentos sejam respeitados, através da imparcialidade, equidade, participação (contraditório) e prazo razoável de decisão, de forma a que se chegue a uma solução que respeite todos os requisitos e que seja simultaneamente justa. Assim não estamos apenas a olhar para a decisão final e a tentar determinar se esta é a mais justa, como garantimos que todo o processo para a resolução de um determinado caso é respeitado e justo.

 

Por outro lado, o professor Freitas de Amaral afirma que encontrar uma definição é sempre a parte mais difícil da construção teórica, sendo que para o mesmo, a justiça é “o conjunto de valores que impõe ao Estado e a todos os cidadãos a obrigação de dar a cada um o que lhe é devido em função da dignidade da pessoa humana”, mencionando saber que a mesma não é perfeita e pode ser criticada por vários motivos.

 

3.  Conclusão 

 

Após a realização desta análise aprofundada a cada um dos princípios constitucionais da Administração, conseguimos perceber a sua importância e relevância nas atuações da mesma, uma vez que regulam todas as iniciativas de maneira a manter o respeito e legalidade perante todos os processos e agentes envolvidos.

 

Podemos ainda perceber que outra das funções é servirem como meio de defesa e garantia dos direitos dos particulares de várias maneiras, quer seja de forma a evitar lesar os direitos dos indivíduos, a prosseguir o interesse público ou então a manter valores tais como a imparcialidade ou a igualdade.

Se me permitem uma apreciação pessoal, a meu ver, o papel dos princípios pode passar um pouco despercebido aos olhos da população, porém, conseguimos perceber que estão presentes e devem ser respeitados em todas as ações da nossa sociedade, quer seja por parte dos órgãos ou agentes, sendo que neste caso o estudo é feito em relação á atuação da Administração Pública, e pode-se concluir que caso algum dos princípios não seja respeitado terá de sofrer as consequências disciplinares estabelecidas para o determinado ato administrativo.

Assim podemos determinar um pouco do papel e influência dos princípios constitucionais na nossa sociedade e na ação da Administração Pública.

 

 

Bibliografia:

 

SILVA, Vasco Pereira da, Direito Constitucional e Administrativo sem Fronteiras , Reimpressão, 2023, Almedina;

 

Otero, Paulo, Manual De Direito Administrativo, Volume I, 5ª Reimpressão, 2013, Almedina;

 

Amaral, Diogo Freitas, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 4ª Edição, 2018, Almedina;

 

 

 

 

Tiago Rita nº66468

Subturma 15, Turma B

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