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terça-feira, 7 de novembro de 2023

Digitalização da Administração Pública na Estónia

   A Estónia é um país pequeno do leste europeu com cerca de 1,3 milhões de habitantes, que desde o início dos anos 2000, tem vindo a desenvolver um sistema digital de administração pública, o e-Estonia, um verdadeiro governo digital, que atualmente oferece 99% dos serviços públicos online.

   O país ocupa a 1ª posição no ranking de serviços públicos digitais em comparação com os restantes membros da União Europeia, sendo que tanto o Governo central como as autarquias locais oferecem serviços online. A Estónia esteve na vanguarda da implementação de várias inovações na área de digitalização dos serviços públicos, como a assinatura digital, o cartão de identidade digital (eID-card) e um sistema de votação digital. No país, a assinatura digital refere-se a assinatura que é legalmente válida, sendo equiparada a assinatura por escrito, não podendo ser confundida com uma assinatura eletrónica, que abrange todos os tipos de assinatura online. Já o cartão de identidade digital, que é emitido pelo Estado, é um documento obrigatório que permite ao governo reconhecer os indivíduos no mundo digital e possibilita aos cidadãos, aceder aos serviços públicos disponíveis. O eID-cards também podem ser instalados nos telemóveis através de um SIM card especial, podendo ser utilizado como um documento de identidade móvel.

   Foi o primeiro país do mundo a adotar um sistema de votação online, que entrou em operação em 2005, sendo que nas eleições de 2019, 27.9% dos eleitores optaram pelo voto online, que pôde ser feito de qualquer país, bastando apenas o eleitor ter acesso a internet. Para além desses, os cidadãos conseguem declarar impostos, fazer a gestão de empresas online e foi o primeiro país da União Europeia a implementar certificados digitais de vacinação durante a pandemia do Covid-19. 

   Outros serviços públicos disponíveis no e-Estonia incluem: as prescrições digitais, que possibilitam aos doentes ter acesso a uma receita eletrónica que é enviada para uma base de dados, acessível por todas as farmácias; o eKool, uma plataforma digital nacional, por onde os pais podem consultar as notas dos filhos e comunicar com os professores e certidão de nascimento eletrônica, que permite fazer o registo de nascimento da criança online. Na verdade, no país, apenas três serviços exigem a presença física do cidadão em uma instituição do governo: casamento, divórcio e transferência de imóvel. A segurança do sistema baseia-se na dupla autenticação, ou seja, na combinação de uma chave digital e do chip presente no cartão de identidade digital.  

   A digitalização melhorou a eficiência e a acessibilidade dos serviços públicos, tendo sido crucial para o crescimento socioeconómico da Estónia. Em 1995, o país ocupava a 76ª posição no ranking de PIB per capita, tendo subido para a 35ª posição. De acordo com Thomas Hendrik Ilves, presidente da Estónia entre 2006 e 2016, a digitalização dos serviços públicos diminuiu a burocracia, pois somente com a implementação da assinatura digital, o Estado conseguiu poupar cerca de 2% do PIB. 

   Com a restauração da independência da URSS em 1991, o país foi confrontado com a necessidade de construir uma nova infraestrutura tecnológica com poucos recursos. A Estónia, que tinha acabado de deixar o bloco comunista, tendo portanto uma infraestrutura de herança soviética, tinha que competir com o ocidente. O primeiro-ministro na época, Mar Laar,  passou a implementar reformas e teve que reconstruir todo o seu sistema jurídico para se adequar as exigências da economia de mercado. O desenvolvimento de um governo digital na Estónia começou com a  aprovação dos princípios da política de informação pelo parlamento em 1994, logo no início da chamada revolução digital, momento em que a Estónia não estava atrás de nenhum outro país neste âmbito. Em 1996, o país implementou um projeto que visava investir fortemente no desenvolvimento e expansão da infraestrutura informática, através de parcerias público-privadas, com especial ênfase na educação, possibilitando que 97% das escolas no país tivessem acesso a internet antes da virada do século. 

   Desde então, o país não deixou de inovar e adaptar as novas realidades. Isso foi exemplificado durante a pandemia de Covid-19, quando os serviços públicos digitais permitiram a continuidade das atividades correntes, porquanto o governo não foi forçado a interromper os seus serviços.

   A administração digital é unificada e centralizada, permitindo aos serviços aceder rapidamente as informações dos cidadãos. Um problema que a Estónia conseguiu ultrapassar, como já mencionamos, foi a unificação de vários documentos de identidade, emitidos por diferentes instituições do Estado, no eID-card, dado que a profusão de dados dos cidadãos em diferentes órgãos administrativos causa duplicação, atrasa a ação da administração na resolução de problemas, prejudicando os cidadãos.

   A política digital do governo é prosseguida por um CIO e sua equipa, integrados ao Ministério de Assuntos Económicos e das Comunicações, no entanto, cada ministro implementa as políticas e estratégias digitais nos seus respetivos domínios da administração, garantindo maior flexibilidade ao sistema. O CIO também é responsável pela Autoridade de Sistemas de informação da Estónia  que coordena o desenvolvimento e administração do sistema de informação do Estado e funciona como a Agência Nacional de Segurança Cibernética.

   A Estónia é uma nação digital e um exemplo a ser seguido quando o assunto é a digitalização da administração pública. As transformações digitais apresentam soluções para resolver problemas de ineficiência que assola a administração pública, mas é necessário garantir que estas novas ferramentas criam oportunidades sem minar a confiança do público nas instituições do Estado.

Referências

https://policyoptions.irpp.org/magazines/february-2019/lessons-estonia-digital-government/

https://www.id.ee/en/article/digital-signing-and-electronic-signatures/

https://e-estonia.com/estonia-a-european-and-global-leader-in-the-digitalisation-of-public-services/

https://www.oecd-ilibrary.org/sites/510a82b5-en/index.html?itemId=/content/component/510a82b5-en

https://www.weforum.org/agenda/2021/10/how-to-build-digital-public-infrastructure-estonia/

Guilherme Arthur Soares Silva, nº68178, 2ºB, subturma 15

Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2023

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